Posted On 2021-03-01 In Casa Mãe de Tuparendá, obras de misericórdia, pastoral prisional, Projetos, Schoenstatt em saída

Olhar nos olhos dos jovens na prisão e ver Jesus… e nós mesmos…

PARAGUAI, Roberto M. González e Maria Fischer •

O motim na prisão de Tacumbú, a maior do Paraguai, terminou com sete mortos por arma branca, alguns deles degolados, dos quais apenas dois haviam sido condenados. Esta não é apenas mais uma notícia. Estou pensando que nossos rapazes, aqueles rapazes que conheci na prisão juvenil, aqueles rapazes que me ofereceram o primeiro tererê da minha vida, que me falaram de seus sonhos para uma família, para uma vida digna, quando fizessem 18 anos poderiam acabar nestas prisões de adultos… “Muitos dos que conheço agora estão lá, envolvidos nessas máfias, alguns deles já estão mortos”, respondeu o padre Pedro Kühlcke. A Casa Madre Tuparenda (CMT) os salva desse destino, pelo menos alguns deles”. —

CMT

Casa Madre de Tuparenda

As vítimas têm nomes. São Francisco Vargas Leiva, Alexis Davis Miranda Candia, Carlos Raúl Casco Rojas, Fernando Ortiz Echeverría, Julio César González Cáceres, Julio César Shaeramm Barrios e Roberto Ríos. Desta lista, González Cáceres e Ríos foram condenados, os demais estavam em julgamento. Têm família? Têm alguém para lamentar sua morte? “É sempre mostrado nas notícias o estado deplorável em que a prisão se encontra. Ninguém se importa com isso porque todos pensam que os criminosos merecem viver como animais. E assim ninguém levanta um dedo para que possam ter melhores condições”, lê-se em um comentário. Penso no Papa Francisco, em sua visita a Lampedusa, em sua pergunta: Quem chorou pelos migrantes que morreram no Mediterrâneo? Agora… Quem chorou por esses sete homens?

A revolta entre os presos em Tacumbú mais uma vez destacou o problema da superlotação nas prisões do país, uma consequência do abuso da prisão preventiva. As autoridades penitenciárias reconhecem que muitos presos sem condenações acabam sendo recrutados como membros de organizações criminosas que operam em prisões.

O jornalista britânico Rowe que em 2019 (Veja Documentário na Netflix, capítulo paraguai. 4ª Temporada) visitou a Penitenciária Nacional de Tacumbú comenta: “Eu nunca vi nada como Tacumbú antes”. Descreveu que ver pessoas que cometeram crimes dormindo no chão, ao ar livre, com outras pessoas com crimes menores, é incomum. Também achou surpreendente que existam empresários detentos que, além de vender drogas, vendem sanduíches, geleias e outros produtos, tudo com a aprovação dos guardas. Outro detalhe incrível para Rowe era que as pessoas andavam por aí com facas “como se não fossem nada”, dentro da penitenciária.

O advogado e professor Jorge Rolón Luna explica que a situação carcerária atual é uma consequência de anos da mesma visão das prisões do Estado. “Desde seus inícios, a prisão começa a revelar suas características. Uma delas é a questão do contágio criminal: é um lugar onde você vai e se torna mais criminoso do que já é e, se não o é, torna-se um criminoso”, afirmou.

Pastoral carcelaria

Pastoral carcerária

O sistema prisional deve curar as chagas, sanar as feridas e gerar novas oportunidades

A Conferência Episcopal Paraguaia (CEP) lamentou a péssima condição em que se encontra todo o sistema penitenciário do país, assim como expressou sua preocupação com a extrema violência, após o último motim registrado na prisão de Tacumbú.

Em vista dos recentes acontecimentos na Penitenciária Nacional de Tacumbú, manifestamos nossas condolências e proximidade espiritual às famílias que tragicamente perderam seus entes queridos.

O violento motim naquela penitenciária, que tirou a vida de sete pessoas e deixou vários feridos, nos mostra mais uma vez, a péssima condição de nossas prisões e de todo o sistema penitenciário paraguaio.

Os fatos mostram que não faz sentido ter uma superestrutura para manter presas as pessoas que têm contas pendentes com o sistema judicial se ainda houver um alto nível de corrupção nas prisões e se uma profunda reforma penitenciária não for realizada.

Lamentamos a falta de uma ação – gestão eficaz e bem sucedida para reduzir a população prisional sem condenação e para evitar a superlotação que é prejudicial aos direitos básicos de todo ser humano.

Também estamos preocupados com a extrema violência com que os grupos criminosos agem, que condicionam as autoridades nacionais à chantagem e ao controle da população carcerária. São cada vez mais numerosos e violentos.

Muitos dos que são privados de sua liberdade e estão cumprindo uma sentença ou estão esperando que a justiça aja de acordo com a lei têm sonhos e esperanças, têm famílias esperando por eles e realmente querem ser reintegrados à sociedade.

Lembrando a viagem do Santo Padre, como pastor de rebanhos, notamos que sempre visitou as prisões e as pessoas privadas de sua liberdade. Em uma ocasião, quando visitou a prisão Curran-Fromhold na Filadélfia (EUA), disse: “É triste ver sistemas prisionais que não procuram curar chagas, sanar feridas, gerar novas oportunidades” e fez um exercício de analogia lembrando a lavagem dos pés que, do ponto de vista cristão, significa serviço ao outro e que todos nós somos filhos de Deus em pé de igualdade.

Nessa época, em setembro de 2015, quando também visitou nosso país, o Papa expressou seu desejo aos prisioneiros e disse que “quer que voltemos aos caminhos, à vida, sentindo que temos uma missão; que este tempo de prisão nunca foi sinônimo de expulsão“.

Instamos o Governo Nacional, o Judiciário e o Legislativo a redobrar seus esforços e nos desafiar a um olhar muito mais humano e humanizador em favor das pessoas privadas de liberdade que realmente merecem uma segunda chance, afinal de contas, é um benefício para toda a população.

cárcel

Pastoral carcerária

“Estive na prisão e foste me ver” (Mt 25,36)

Atualmente, o governo está construindo três novas prisões, uma das quais será a primeira prisão de “segurança máxima” para os “criminosos mais perigosos”.

Podemos falar durante horas sobre o trabalho das pastorais carcerárias no Paraguai e no mundo, mas isto não tem utilidade se não trabalharmos em uma mudança de paradigma, de visão em relação aos nossos irmãos e irmãs que estão no sistema penitenciário.

Quando descobrimos nos olhos dos jovens que estão dentro do Centro Educacional de Itaugua o desejo de viver com dignidade, de sentir-se amados por suas famílias, podemos não só ver Jesus neles, mas também a nós mesmos.

São jovens que não tiveram as mesmas possibilidades que outros e foram empurrados para a delinquência por necessidade ou por más companhias, acabando finalmente no duro sistema penitenciário. A diferença entre um “centro educacional” (que de educacional tem apenas o nome) e uma prisão para adultos é muito pequena.

As “segundas chances” não acontecem muitas vezes, mas para a maioria desses jovens, mais do que uma segunda chance, é a primeira vez que recebem uma formação estável em um ambiente saudável, que encontram quem está disponível para acompanhá-los em seu crescimento pessoal para serem as pessoas que Deus pensou. Este é o papel da Casa Madre Tuparenda.

Um centro de reabilitação pós-penitenciário é um nome muito forte. Muito forte porque aos olhos de muitas pessoas os “delinquentes” deixam de ser pessoas perante a sociedade e só têm direito a uma vida na prisão. Se for uma sentença de prisão perpétua, tanto melhor, e até mesmo a morte em alguns casos.

Mas será este o ideal de cristãos que queremos viver em nosso tempo? Um ideal em que um “erro”, por pequeno ou grande que seja, já é uma predestinação para uma vida de erros?

Não é fácil trabalhar com pessoas para ajudá-las a melhorar a cada dia, pensemos em outro ambiente fora da prisão. Quanto tempo leva para um novo funcionário aprender o funcionamento da empresa? Seus erros são puníveis com a pena capital? Então, um adolescente crescendo em uma sociedade que já é violenta, tudo o que merece é ser preso a partir dos 14 anos de idade por cometer um erro?

Não estamos falando de deixar este “erro” impune, não. Mas sim de trabalhar com e a favor da pessoa, a fim de evitar que este comportamento continue a se desenvolver e a aumentar de intensidade.

Hoje o sistema penitenciário clássico está desatualizado, perpetuando um ciclo de violência que é muito difícil de quebrar, mas não impossível, e o trabalho da Casa Madre é um exemplo disso, tentando garantir que menos jovens se encaminhem para a universidade do crime organizado, que hoje é um flagelo para toda a sociedade paraguaia.

O primeiro tererê 

Não posso terminar este primeiro artigo de uma série que estamos preparando com Roberto sem a história do meu primeiro tererê. Foi em março de 2015, em minha primeira visita à CEI em Itauguá, com o Pe. Pedro Kühlcke – embora não fosse minha primeira visita a uma prisão, mas esse é outro assunto. Estávamos dentro da prisão, no pátio, em um dia quente, cercados por muitos jovens, com abraços fortes, com fotos, com longas trocas com o Pa’i e timidez com esta senhora alemã que tinha vindo de tão longe para visitá-los. Num momento em que o Pe. Pedro estava com um jovem que queria se confessar, três jovens se aproximaram de mim com uma garrafa térmica e um mate com tererê… Mãos sujas, rostos sujos, garrafa térmica de cor indefinida, um sorriso entre dentes quebrados, uma bomba para todos… Vão tomando, um após o outro, e com um olhar que nunca conseguirei esquecer, um deles me perguntou: “Você quer uma tererê?” Eu já estava no Paraguai há uma semana, mas ninguém tinha me oferecido uma tererê. É um momento que parece uma eternidade. Olhares de expectativa, um “Você quer um pouco, tia, eu fiz para você, vamos beber juntos?”, um momento de susto nos olhos do padre Pedro Kuehlcke que se transforma em satisfação completa no momento do meu primeiro gole. É meu primeiro tererê e nunca mais tomei um tererê tão bom, um tererê com gosto de pobreza, de miséria, de esperança, de solidariedade, de amizade e de compromisso com essas crianças e o desejo de pedir o Prêmio Nobel da Paz para o padre Pedro. É um momento de amizade com estes três meninos e com todos aqueles que estão nesta prisão. É um dos maiores presentes da minha vida. Tenho amigos entre os pobres.

Sim, Roberto, você está certo. Temos que mudar a visão. Vi Jesus nos olhos desses três garotos que me ofereceram e compartilharam comigo o tererê. Meus amigos.

Marzo de 2015, con mis amigos

Março de 2015, com meus amigos

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BIC/SWIFT: GENODEM1DKM
Previsão de uso: Pe. Pedro Kühlcke, Casa Madre de Tupãrenda

Original: Espanhol (28/2/2021). Tradução: Luciana Rosas, Curitiba, Brasil

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