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Posted On 2023-07-13 In José Kentenich

Um outro olhar sobre o Padre Kentenich: artista conceptual

Pe. Elmar Busse •

Se se for às publicações sobre o Padre José Kentenich utilizando os métodos de análise de conteúdo qualitativo da ciência da comunicação ou a pesquisa de palavras-chave do marketing, analisando publicações sobre o Padre José Kentenich, encontrar-se-á Kentenich com a barba branca como marca figurativa ou logótipo, e em palavras-chave como: “brevemente canonizado”, “sempre”, e desde 2020: “Abuso”. Na série de artigos que se segue, gostaríamos de lançar um outro olhar sobre Kentenich – nem a imagem de um São Nicolau de barba branca, nem o candidato à canonização, mas nem o suspeito de abuso de poder ou de abuso espiritual. —

Estes textos foram escritos há cerca de 30 anos. A perseverança da Igreja, cuja respiração é muito lenta, permite-nos trazer estes textos de volta à discussão com ligeiras actualizações. Esperamos, para além das atribuições habituais, tornar possível um novo e animado olhar sobre a multifacetada figura fundadora e assim despertar a curiosidade de a tratar com maior intensidade. Acreditamos que vale a pena!

Nascido na Argentina em 1973, o artista Tomás Saraceno tem uma predileção pelas aranhas e, mais ainda, pelas suas teias. Nas suas instalações, que preenchem espaços, estica finos cabos de aço, que liga com pequenas peças em T ou triângulos. Algumas das suas instalações são acessíveis. Após os estudos de pós-graduação na Städelschule de Frankfurt, decidiu viver e trabalhar na Alemanha. Tornou-se conhecido através da sua escultura na Bienal de Veneza em 2009. Em Frankfurt, uma das suas instalações pode ser vista no Roßmarkt em 2010/11.

Ligar coisas que são vistas como separadas

Numa entrevista, afirmou que, com as suas teias de aranha, pretende “ligar coisas que são vistas como separadas”.

O conhecido teólogo e escritor protestante Jörg Zink analisa-o de forma semelhante quando formula o resultado de uma ligação mais íntima com Deus: ser Um com o todo. Com o espírito vivo, universal e transcendente. Não estar separado da terra. Não para ser superior a tudo, mas para pertencer e, assim, não cair na maldição do desenraizamento que é a causa de tantas doenças que afligem a alma do Homem moderno. Não sucumbir ao ódio à beleza e à dignidade das coisas que destrói hoje tudo o que vive

Teia de aranha ou organismo de vínculações

O Padre Kentenich nunca criou uma obra de arte na sua vida, mas a preocupação de ligar coisas (e pessoas) “que são vistas como separadas” era também um anseio do seu coração. Ele cunhou o termo “organismo de vínculações”. A sua própria biografia – a mãe teve de o colocar num orfanato em Oberhausen quando ele tinha oito anos e meio para poder trabalhar – tornou-o sensível ao tema dos vínculos. Não tinha amigos, nem no orfanato nem mais tarde, durante os estudos, e sofria de uma solidão sem limites. Mais tarde, como Pastor, soube dar e receber uma proximidade incrível, e ele próprio interpretou esta mudança de personalidade como um milagre de cura que Nossa Senhora tinha pedido a Deus que lhe fizesse.

Como teólogo, é claro, ele foi mais fundo. Perguntou-se porque é que a Santíssima Virgem podia agir assim. As suas perguntas e buscas terminaram quando se tornou claro para ele: uma pessoa que é salva do pecado original deve ser também uma pessoa plenamente capaz de se vincular. Apenas 31 anos antes do nascimento do Padre Kentenich foi proclamado solenemente o dogma da Imaculada Conceição de Maria.

Na linguagem figurada da Queda do Homem no primeiro livro da Bíblia, descreve-se como o Homem começa a envergonhar-se (= perturbação da vinculação consigo próprio), a fugir de Deus e a esconder-se (= perturbação da vinculação com Deus), e finalmente – confrontado por Deus – a transferir a responsabilidade para Eva e para o próprio Deus (“A mulher que me deste…” = perturbação da vinculação com outros seres humanos). Neste contexto, a Salvação pode ser interpretada como uma capacidade crescente de criar vínculos.

A necessidade de criar vínculos e o medo de se vincular

O pedo-psicólogo John Bowlby, juntamente com Mary Answorth, descobriu e descreveu, após a Segunda Guerra Mundial, a vinculação pessoal como uma das necessidades humanas básicas e foi, por isso, inicialmente considerado um herege na paisagem psicológica, que na altura era fortemente influenciada pela psicanálise de Siegmund Freud, que atribui todos os impulsos e motivos humanos à sexualidade. No entanto, Bowlby e Answorth conseguiram corroborar as suas teorias com experiências transculturais e documentos filmados, convencendo gradualmente os cépticos. Atualmente, para os psicólogos e pedagogos, a necessidade de vinculação das pessoas é inquestionável.

Mas, e este é o grande paradoxo das últimas décadas, apesar desta necessidade de vínculos, cada vez mais pessoas têm um medo acentuado das relações e evitam-nas. Desde a reportagem de capa da STERN, em Novembro de 2013, o número de publicações sobre o tema da ansiedade das relações aumentou enormemente. É claro que, antes de Bowlby, os escritores e editores tinham uma ideia do tema, mas tratava-se de destinos individuais e não de um fenómeno de massas.

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Pensamento mecanicista

O Padre Kentenich não chama a este fenómeno “medo da vinculação”, mas sim “pensamento mecanicista”. O contraste entre os teóricos e os ideólogos afectados pelo pensamento mecanicista e o fundador de Schoenstatt, preocupado com a observação reverente e o apoio aos processos da vida, é tão gritante como o entomologista francês Jean-Henri Fabre (*1823 – 1915) o expressou uma vez numa comparação descrita com os seus colegas. Munido de um pau e de uma lupa, percorria a paisagem sob um calor abrasador, agachava-se diante das tocas para observar com uma paciência sem limites o comportamento surpreendente do mundo dos insectos. Julgou os seus colegas e os seus métodos nos laboratórios: “Vocês estripam o animal, eu estudo-o vivo; vocês fazem dele uma coisa de terror e de pena, eu faço-o digno de ser vivido; eu trabalho ao ar livre enquanto as cigarras cantam; vocês submetem a célula e o protoplasma a reagentes; vocês estudam a morte, eu estudo a vida”.

Estas duas mentalidades e estruturas de pensamento fundamentalmente diferentes têm dificuldade em encontrar-se. O Pe. Kentenich observou que o pensamento mecanicista estava a caminho de se tornar o modo de vida dominante na Alemanha e na Europa. E, ao mesmo tempo, teve de se aperceber de que a Igreja oficial não via a dimensão destes problemas e não os tomava em consideração na sua acção pastoral. A advertência do Pe. Kentenich ao bispo de Trier, em 1949, não foi ouvida. Entretanto, a situação na Alemanha desenvolveu-se como o Padre Kentenich temia. Em 1961, ele escreveu num estudo:

“Quem teve de suportar muita falta de amor e muita fome de amor, sobretudo na infância e na adolescência, fica geralmente doente da capacidade de amar ao longo da vida. Não é por acaso que se fala por todo o lado da necessidade de criar vínculos, da falta de vínculos ou da incapacidade de os modernos criarem vínculos. Não se trata apenas de uma doença contagiosa de tipo vulgar, mas sim de uma praga terrível que se instala não só nas relações humanas, mas também no seio sagrado da família, e que causa estragos por todo o lado. Quantas vezes temos de admitir que os pais de hoje já são filhos de pais com perturbações de amor. Não nos devemos surpreender se os seus próprios filhos já não têm o poder de amar nas profundezas fluidas do seu ser, mas muitas vezes apenas tentam os gestos de amor comoventemente desajeitados”.

Em que é que Schoenstatt pode contribuir para o caminho sinodal da Igreja universal?

Quando se pergunta o que Schoenstatt tem a contribuir para o caminho sinodal para uma Igreja sustentável, podemos formular: Schoenstatt quer ajudar a construir uma nova cultura de Aliança. Quer, nas palavras de Tomás Saraceno, “ligar coisas (e pessoas!) que são vistas como separadas”. Pense na sua música preferida, no seu livro preferido, no seu autor preferido, no lugar preferido da sua casa e do seu ambiente, na sua passagem bíblica preferida, na sua cena preferida da vida de Jesus. Lembre-se das vezes em que fez novos amigos ou selou novas amizades. Por outras palavras: tome consciência da teia de relações, da “teia de aranha” que teceu e que o prende hoje.

A essa teia deve a sua estabilidade psicológica. Pode estar sinceramente grato por ela. Celebre a sua teia de vinculações.

Original: alemão, (25/6/2023). Tradução: Lena Castro Valente, Lisboa, Portugal

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