Für Demokratie

Posted On 2024-02-01 In Artigos de Opinião

“Uma manifestação contra o molho castanho? Maria, temos de lá ir!”

Maria Fischer, Alemanha •

Dia da Memória do Holocausto, 27 de Janeiro de 2024, um dia solarengo de inverno. Enquanto me dirijo para visitar a minha irmã no Lar de idosos de Troisdorf, onde ela vive há quase seis anos, como faço todos os sábados, ouço na rádio as notícias sobre as numerosas manifestações de hoje contra o extremismo de direita, contra a xenofobia, contra o anti-semitismo, por uma democracia aberta, colorida e diversificada. E arrependo-me de não ter tirado algumas horas do trabalho no dia 22 de Janeiro para assistir à manifestação em Bona. Estavam lá milhares de pessoas. No final, cantaram o Hino à Alegria: “Todos os Homens se tornam irmãos“. Pele de galinha. —

Estarei presente na minha cidade, Siegburg, na próxima quarta-feira. Penso no meu avô, que como corajoso Presidente da Câmara da sua pequena cidade enfrentou os nazis (e mais ainda o Exército Vermelho e os comunistas). E, no nosso fundador, o Padre Kentenich, que desde muito cedo alertou contra esta ideologia e acabou num campo de concentração. Penso nas enfermeiras do Lar de idosos, vindas da Alemanha, do Médio Oriente, da Europa de Leste, de África… E penso nas pessoas que lá estão, na minha irmã com deficiência mental depois de um AVC, nas senhoras mais novas com esclerose múltipla e AL, na senhora idosa sempre sorridente com um tumor cerebral, nas mulheres e homens com demência e naqueles que simplesmente precisam de ajuda. Serão eles os próximos quando a “remigração” acabar? Serão a ultradireita e todos aqueles que só se “informam” no Facebook e papagueiam a desinformação que circula nas redes que determinam a vida de quem, ou melhor, a vida de quem vale a pena ser vivida? E o que farei quando chegar a altura? E o que faço agora?

No meio destas reflexões, a minha viagem sofre uma paragem abrupta. Um posto de controlo. A polícia manda-me para uma rua secundária e, quando guio de novo para o Lar e não consigo ir mais longe, vejo-os: uma enorme multidão na “Praça dos Direitos Humanos”, em frente à Câmara Municipal… Um desfile de Carnaval? Mesmo que pareça colorido e até haja um “triunvirato” no meio da gala – para quem não é da Renânia: as autoridades carnavalescas da Renânia. Não, trata-se de uma manifestação contra o extremismo de direita, a favor da diversidade e da democracia. A marcha pelo centro da cidade termina aqui.

Por momentos, penso em mudar de planos e juntar-me a eles, mas alguém está à minha espera…

A vista da janela

Da janela do quarto do Lar, vejo a manifestação, que parece estar quase a terminar. A minha irmã olha sempre para onde estou a olhar, por isso digo-lhe: “Estão a manifestar-se contra o extremismo de direita…”.

Ela olha para mim, e depois vem com uma certeza explosiva: “Uma manifestação contra o molho castanho? Maria, temos de ir lá!” (Nota: “molho castanho, em alemão “braune Sauce”, refere-se à cor do partido nazi, e a palavra “Sauce” substitui um “palavrão” por um S…).

Dez minutos depois, estamos na praça da Câmara Municipal, ela numa cadeira de rodas, eu com muito orgulho. “A democracia é a forma política da dignidade humana”, diz Elisabeth Winkelmeier-Becker, deputada do Bundestag e colega de escola da minha irmã. Ela congratula-se com o facto de tantas pessoas se terem levantado do sofá para dar um exemplo de democracia.

Está quase a acabar, as pessoas já se estão a ir embora, regressando ao evento carnavalesco no Pavilhão Municipal em frente e aos bares e cafés circundantes para se aquecerem.

Nós estivemos lá. É isso que conta.

Quando chego a casa, encontro um e-mail da Irmã Elinor Grimm, “a de Dachau”. “Amanhã há uma manifestação de uma grande Aliança em Dachau contra o extremismo de direita. Eu apoio tudo, mas não se pode estar em todo o lado em termos de tempo. Penso que a oração é muito importante da nossa parte. Continuo a confiar na Regina Pacis, a Rainha do Campo de Dachau”.

No Domingo, na Missa dominical, o nosso pároco convidou-nos a participar na manifestação de quarta-feira, na minha cidade. Eu estarei lá.

#WeRemember#WeRemember

#Nuncamaiseagora

Que a memória do horrível assassínio em massa de milhões de judeus e de pessoas de outras religiões no século XX nos ajude a todos a não esquecer que a lógica do ódio e da violência nunca pode ser justificada, porque nega a nossa humanidade.

Papa Francisco, 27 de Janeiro de 2024

Original: alemão(28/1/2024). Tradução: Lena Castro Valente, Lisboa, Portugal

 

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