Posted On 2014-04-01 In Artigos de Opinião

A liderança e os seus desafios

MUNDO DO TRABALHO, Carlos Barrio e Lipperheide. Uma das principais dificuldades que enfrenta um líder durante o processo das suas atividades, é distinguir os distintos tipos de desafios que deve enfrentar para cumprir os seus objetivos. É uma crença muito difundida que os desafios se resolvem simplesmente através da implementação de questões técnicas. Esta crença – limitadora – é provavelmente uma das principais dificuldades que deve enfrentar um líder.

Seguindo R. Heifetz e M. Linsky[1] podemos distinguir dois grandes desafios: os técnicos e os adaptativos. Os primeiros são aqueles que se resolvem através de uma aprendizagem técnica e que é possível precisar com bastante certeza. Pelo contrário, os desafios adaptativos, ou seja, aqueles que não dependem da destreza ou de conhecimentos técnicos, referem-se a questões culturais, emocionais ou de valor, que requerem do líder e da sua equipa uma mudança de atitude frente à sua conduta presente, quer dizer, exigem uma aprendizagem que vá para além da técnica.

Em geral, os desafios que enfrentamos apresentam uma mistura de ambos os aspetos. Os aspetos técnicos são geralmente bastante assertivos e claros. Em contrapartida os adaptativos ficam escondidos, o que nos leva a descuidá-los.

O olhar da realidade limita e condiciona muitas vezes a capacidade para descobrir novas possibilidades


É precisamente desta brecha de aprendizagem adaptativa que se deve ocupar o líder, procurando que a sua equipa vá descobrindo como o olhar da realidade limita e condiciona, muitas vezes, a sua capacidade para descobrir novas possibilidades que aí existem. Esta mudança quase sempre implica uma incerteza, uma dor e uma possível perda, e requer uma revisão dos comportamentos anteriores.

Provavelmente será a rigidez para ver e enfrentar os desafios adaptativos o que leva muitos empresários a fracassar no êxito dos seus projetos, acreditando que se trata apenas de mudanças técnicas.

A árvore de Ground Zero

Recordo-me de um acontecimento que interpreto com uma metáfora de aprendizagem das inúmeras possibilidades que sempre temos para poder levar a cabo os nossos sonhos e superar a brecha adaptativa:

Houve um último sobrevivente a ser resgatado da zona Zero do atentado de 11 de setembro de 2001 em Manhattan, Nova Iorque. Esteve enterrada um mês e meio entre os escombros e resistiu às milhares de toneladas de aço e cimento que caíram sobre ela.

No início de novembro de 2001, enquanto as ruinas da Zona Zero ainda fumegavam, as equipas de resgate fizeram uma insólita descoberta; uma árvore que estava queimada em 98%, mas que apesar disso tinha rebentos na sua escassa superfície de tronco não carbonizada. Tinha sobrevivido aos mais 1650 graus centígrados produzidos pelas explosões e incêndios.

Diz-se que algumas das pessoas que viveram esse momento não conseguiram evitar as lágrimas. Era um pequeno sinal de vida no meio de tanta desolação, tristeza e horror.

A árvore foi transportada para um viveiro de Brooklyn para ser cuidada. Na primavera seguinte floresceu, crescendo-lhe novos ramos. Incrivelmente em março de 2010, uma forte tempestade, arrancou a árvore. Mas, mais uma vez, resistiu e recuperou!![2]

Voltar a renascer


Em distintas circunstâncias da nossa vida sentimo-nos desolados, desorientados, sem saber como avançar. O nosso olhar torna-se sombrio e muitas vezes sem capacidade de ver uma saída.

Contudo sabemos que, apesar de tudo, guardamos no nosso interior – como a árvore – algo com o qual podemos renascer e florescer no meio da confusão e das temperaturas esmagadoras. O líder deve clarificar e acompanhar este caminho, oferecendo a sua ajuda para que a sua equipa possa descobrir possibilidades onde aparentemente só há incerteza, medo ou confusão.

Reconstruir as torres gémeas ou reforçar as medidas de segurança para proteger o terrorismo não representava um problema técnico. Sabia-se o que fazer. O verdadeiro desafio era adaptativo: como renascer emocional e vitalmente das cinzas de semelhante atentado; como adaptar-se a uma nova realidade, a um mundo que não ia voltar a ser o mesmo.

Nas empresas enfrentamo-nos, em muitas circunstâncias, com estes desafios que – segundo R. Heifetz e M. Linsky – “A sustentabilidade da mudança depende do facto de que os indivíduos que têm um problema interiorizem a mudança propriamente dita”[3] e não creiam que a solução do desafio venha das indicações do chefe ou da administração.

Da ideia à vida, de “alguém” a mim

Neste aspeto os líderes têm uma função insubstituível de transferir e passar organicamente às suas equipas a responsabilidade de interiorizarem os desafios para que sejam assumidos. De outro modo, não se levará a cabo uma incarnação dos mesmos e continuarão apenas na cabeça dos líderes. Assim, a mudança que se pretenda implementar não será vivida por todos os colaboradores da empresa e não chegará às raízes.

Por este motivo o desafio adaptativo deverá ser interiorizado, em primeiro lugar, pelo próprio líder, ou seja, deverá ser vivido como tal, de forma autêntica e sem máscaras. Se assim não for não penetrará no interior da pessoa. [4]

Apenas a partir desta autenticidade poderemos “definir a partir de dentro o nosso próprio eu” [5]e não artificialmente. Definitivamente, trata-se de liderar “… homens com motivação e iniciativa próprias que, a partir do interior, respondem aos seus ideais e que são fiéis nos bons e maus momentos, por motivação e iniciativas próprias.”[6]

Será através de uma vinculação interior do líder com a sua verdade (e assim consigo próprio), que penetre até ao mais profundo do seu ser, que se poderá originar a mudança, porque se terá incarnado e passado da ideia para a vida.

Carlos E. Barrio e Lipperheide

27/3/14

Original: Espanhol – Trad.: Maria de Lurdes Dias, Lisboa, Portugal


[1] Ronald A. Heifetz – Marty Linsky, “Liderazgo sin Límites”. Ed. Paidós Empresa, 2011, págs 27 y ss

[2] Este sobrevivente é uma árvore de flor que se plantou na década de setenta na praça do World Trade Center, no extremo este (próximo de Church Street). En dezembro de 2010, foi trasladada para o local actual, no Memorial do World Trade Center.

3 idem.

[4] José Kentenich, “En Libertad ser plenamente hombres”. Ed Patris (2003), pág 184

[5] Idem, pág. 181

[6] Idem, pag 167

Leave a Reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *