Cuba

Posted On 2023-04-20 In Schoenstatt em saída

De visita a Cuba, pois não se anuncia o Evangelho parados, fechados num escritório

CUBA, Pe. José Luis Correa Lira • 

Pode parecer repetitivo dizer que a situação em Cuba é pior do que nunca, pior ainda do que no chamado “período especial” dos anos 90. —

Nas províncias (na capital não se atrevem a fazê-lo, porque haveria uma revolta da população já farta de tanta miséria) há cortes de energia todos os dias e podem durar horas. Experimentei isto duas vezes no início das Missas que celebrei na paróquia de Santa Ana em Camagüey e em Santa Cruz del Sur. Como é que mantêm refrigerada as (poucas) coisas que têm para comer? Como é que suportam o calor e a humidade numa ilha tropical?

Cuba está a despovoar-se

Cuba

Pe. José Gabriel

O que é novo este ano não é a habitual falta de alimentos, medicamentos e bens de primeira necessidade, mas o facto de também não haver agora petróleo.

A outra novidade é o êxodo de mais de 300.000 cubanos nos últimos tempos. Cuba está a ficar despovoada. Os jovens não aguentam mais e na primeira oportunidade partem e vão para qualquer lugar… O programa “Parole – (Liberdade Condicional)” está a ajudar a emigração legal para os EUA. Já não só se pode apenas ‘mandar chamar’ os parentes de primeiro grau e levá-los consigo para onde se está, um processo que pode levar anos, se se conseguir obter os vistos. A liberdade condicional (Parole) permite agora que até 7 membros da família saiam imediatamente.

Mesmo assim, ainda há pessoas que partem de jangada (conheci a irmã de um balsero recente) e outros que viajam pela América do Sul ou Central e começam a sua viagem através das fronteiras sem saber se serão recebidas ou deportadas e se conseguirão, pois a travessia, por exemplo, do “Tapón del Darién” entre a Colômbia e o Panamá, é quase suicida, e o que dizer dos maus tratos, humilhações, violações e outras coisas que sofrem às mãos dos “coiotes”.

Uma ditadura de mais de sessenta anos

A educação e a saúde estão de rastos. Se alguém tem de ser operado (que perigo!) tem que levar tudo consigo, desde algodão até ao fio de sutura, bem como anestesia, luvas, e todos os outros medicamentos, mais dinheiro extra para o médico ou enfermeiro que o trata.

O estado das estradas é deprimente, embora isto não seja novidade. Viajei por terra, de Havana para Camagüey e de volta e de Vertientes para Santa Cruz del Sur.

O país foi dividido entre a nova burguesia: os antigos militares e os seus filhos e netos (os únicos que vivem bem; os restantes mal sobrevivem).

Em suma, daria para escrever um livro descrevendo toda a miséria em que o regime ditatorial de mais de seis décadas mergulhou esta bela ilha.

Ainda há fé nesta ilha

No que diz respeito à fé, fiquei impressionado pelo facto de, apesar de haver tão poucos sacerdotes (alguns deles não resistem e acabam por sair) e menos seminaristas (nem sequer 25 no total para todo o país!), a fé dos poucos fiéis é mantida, cultivada e expressa.

Juntamente com as Missas que celebrei em Camagüey e Santa Cruz, tive de presidir e pregar a Missa de casamento de quatro casais. Pela primeira vez, nos meus mais de 30 anos como padre, participei num casamento comunitário. No entanto, o mais surpreendente é que os quatro casais eram adultos. Sim, há algumas conversões de pessoas mais velhas.

Cuba

O Santuário de Nossa Senhora de Regla

Onde nunca tinha estado ou celebrado antes, foi no Santuário de Nuestra Señora de Regla, um município nos arredores de Havana. Um lugar de devoção muito popular misturado com elementos de Santería (Crença religiosa dos negros cubanos em que existe um sincretismo de práticas animistas cristãs e africanas.N.T.). Fui celebrar a Missa a meio da manhã de sábado e depois dar uma palestra sobre Nossa Senhora de Schoenstatt (esta última foi uma ocorrência espontânea do pároco, Pe. Roberto B., que animou a Missa histórica e multitudinária de São João Paulo II em Havana há um quarto de século). No final, partilhámos um delicioso almoço na reitoria.

A Mãe Peregrina conquista corações cubanos

Na viagem de regresso à capital, pudemos ao menos saudar um seminarista diocesano da Florida (Usiel).

Na tarde e noite anteriores, ao regressar de Camagüey, pude encontrar-me, caminhar, jantar e sobretudo conversar longamente com o nosso querido Pe. Jorge R., que aguardava o visto para ir a Miami, onde o seu bispo tinha providenciado para que fosse recebido pelo Arcebispo de lá.

Juntamente com os nossos queridos Padres Rolando e José Gabriel (ambos de Camagüey) temos um quarteto de seminaristas ligados a Schoenstatt. Dois serão ordenados, se Deus quiser, este ano como diáconos em trânsito e os outros dois têm um tempo de estudo e formação à sua frente.

Um deles tinha-me pedido uma imagem da Mãe, que graças a Deus eu pude levar-lhe. Provocou um furor entre as pessoas e espero trazê-la em peregrinação ao seminário. Fiqueia dever uma ao diácono permanente daquela paróquia e uma sacerdotal ao pároco.

Três malas cheias de roupa, medicamentos e outras coisas

Nesta ocasião viajei com três malas, cada uma pesando 23 quilos, cheias de roupa, medicamentos e objectos de piedade, tais como terços e estampas sagradas, todas cortesia das pessoas do Movimento da Costa Rica e recebidas e distribuídas pelos Padres, pelas quais estão infinitamente gratos!

No sábado à tarde quis ir saudar e falar com o Padre Reinier, um Carmelita que tem uma Aliança com a Mãe, mas um enorme pedaço do telhado da igreja paroquial caiu, pelo que só nos pudemos encontrar no Domingo à tarde. Nessa paróquia os frades carmelitas guardam a escultura de Santa Teresa dos Andes que, por ocasião da visita do Papa João Paulo II, há pouco mais de um quarto de século, foi trazida a Cuba pelo meu irmão da comunidade e bispo que me ordenou padre há 32 anos, D. Manuel Camilo Vial.

Cuba

A fé vive de encontros

À medida que a vida acontece, como um presente inesperado, conheci o Cardeal de Havana, D. Juan de la Caridad, na casa sacerdotal. Conhecemo-nos há anos, quando ele ainda era Arcebispo em Camagüey e depois no retiro anual que preguei ao clero e em outras visitas. Pudemos conversar por um momento e dizer-lhe o que eu estava a fazer desta vez. É sempre muito refrescante conhecê-lo, olhar para ele e ouvi-lo.

Domingo da Misericórdia em Bauta

No Domingo da Misericórdia fui celebrar a Missa nas paróquias de Bauta e Playa Baracoa, graças aos esforços do meu homónimo seminarista, cujos pais pudemos acolher no Santuário de Schoenstatt em San José, Costa Rica, no ano passado, na sua odisseia para os Estados Unidos.

Em Bauta, um município nos arredores de Havana, a igreja paroquial estava repleta de gente. Havia um coro espectacular, uma equipa litúrgica de alto nível e um pároco com meio século de sacerdócio atrás de si. Nas suas últimas palavras, o meu homónimo trouxe lágrimas aos olhos de todos, e quando digo todos, eu incluído.

No nosso regresso da segunda Missa desse Domingo, também conhecida como ‘Quasimodo’, fomos recebidos para o almoço por uma família na própria aldeia de Bauta. Outra experiência de calorosas boas-vindas cubanas, onde se oferece e se come o que se tem e se desfruta de amizade e se partilha a fé e a esperança.

Adeus a Cuba

Naquela noite de Domingo, dia 16, pude saudar e conversar por um momento com o Arcebispo de Camagüey, D. Willy, que tinha chegado nessa tarde à casa sacerdotal em Havana para uma reunião da Conferência Episcopal que estavam a realizar nessa semana.

O bom foi que o Pe. José Gabriel (União dos Sacerdotes) já lhe tinha dado o presente que lhe tinha trazido da Costa Rica e tinha sido informado da minha visita à sua Arquidiocese e que, por razões de força maior, não tinha podido ir cumprimentá-lo pessoalmente (o motor de arranque da carrinha do Pe. Rolando tinha avariado, um carro nada pequeno que tivemos de empurrar algumas vezes quando fomos celebrar a Missa na cidade na quarta-feira anterior).

Na segunda-feira, pouco antes de regressar ao continente, concelebrei Missa nas freiras carmelitas, a quem costumo passar para dizer olá. Concelebrei com o Vigário Geral das Carmelitas, que é responsável pela Ordem Carmelita Secular no mundo, um mexicano que preside à cúria geral em Roma.

Não há proclamação sem movimento, sem “saída”, sem iniciativa.

Isto significa que não há cristão se ele não estiver a caminho, não há cristão se o cristão não sair de si próprio para se pôr a caminho e levar um anúncio.

Não há proclamação sem movimento, sem caminhar.

O Evangelho não é proclamado ficando parados, fechados num escritório, à secretária ou no computador, fazendo polémicas como “leões do teclado” e substituindo a criatividade da proclamação pelo corte e colagem de ideias tiradas daqui e dali.

O Evangelho é proclamado movendo-se, caminhando, indo.

Papa Francisco

O Evangelho é proclamado movendo-se, caminhando, indo… a Cuba

Cuba

Original: castelhano (18/4/2023). Tradução: Lena Castro Valente, Lisboa, Portugal

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