Posted On 2014-05-21 In Schoenstatt em saída

Na força da Aliança, com Maria ao encontro do Cristo que sofre

CHILE, Ir. M. Renata. Depois do grande incêndio ocorrido em Valparaíso, mesmo antes da Semana Santa, surgiu entre várias jovens da Juventude Feminina da zona Maipo a inquietação: Como vamos ficar todos aqui a celebrar tranquilamente a nossa Semana Santa sabendo que há tantos irmãos chilenos a sofrer tanto? Porque não ir ajudá-los?… Saiamos ao encontro do Cristo que carrega a cruz em tantas pessoas concretas e levemos-lhes uma mensagem de esperança! Levemos-lhes a alegria da Ressurreição, a mensagem de que Deus é capaz de começar do zero, criar do nada, vencer a morte. Vamos animá-los no meio de tanta dor.

As pessoas necessitam de ser ouvidas

O que parecia ser uma loucura transformou-se em realidade. Entrámos em contacto com um pároco que podia necessitar de ajuda. A paróquia chama-se Nossa Senhora de Andacollo, situada no morro Ramadita, um dos morros afetados pelo incêndio. Pensámos em ir para acompanhar, para dar uma palavra de alento e uma mensagem de esperança. O pároco disse-nos que precisavam de ajuda e que punha à nossa disposição o salão paroquial, cozinha e casas de banho para que lá ficássemos. A conversa foi rápida, notava-se que estava com muito trabalho. Comentou que as pessoas necessitavam de ser ouvidas e que seriamos bem-vindas.

De todos os lados chegava-nos informação de que não eram precisos mais voluntários e muitas outras vozes para que desistíssemos, mas rezámos, e confiantes nas portas que se nos iam abrindo (doação de passagens, donativos em dinheiro, alimentos, etc.), pusemo-nos a caminho.

Alegra-te Maria, a minha aliança traz Cristo

Partimos, enviadas do Santuário da Providência, na Sexta-feira Santa, dia 18, dia de Aliança, sob o lema do nosso encontro nacional de juventude no verão, “Reginae Sum”: Alegra-te Maria, a minha aliança traz Cristo. Fomos enviadas, cada uma com a sua Mãe Peregrina a percorrer as ruas de Valparaíso. Na força de Aliança, com Maria ao encontro do Cristo que sofre.

Chegámos a Valparaíso, ao morro Ramadita. A paróquia, que se encontra na metade do morro, não foi afetada pelo incêndio. Caminhando alguns metros para cima, começava a devastação. Do morro podiam ver-se os morros vizinhos ou caminhar até ao setor de Rocuant. O panorama era desolador. O incêndio arrasou sem deixar nada. Escombros, florestas queimadas, sítios irregulares a descoberto no meio de ruas tortuosas.

A paróquia de Nossa Senhora de Andacollo, tinha-se transformado num centro de recolha. Até na igreja havia colchões empilhados! O salão paroquial (onde ficaríamos) estava repleto de roupa de todo o tipo. No local alojavam, já outros grupos de voluntários. Jovens provenientes de todas as partes com muito boa vontade. A maioria não eram católicos e o ambiente estava longe de ser semelhante ao espírito de qualquer outra missão que tínhamos vivido.

As pessoas não querem mais massa… não têm panelas, não têm gás para cozinhar

O pároco encontrava-se no terreno, depois de ter trabalhado pelas pessoas do seu morro passou para os morros vizinhos oferecendo ajuda. Ia perguntando quantas famílias existiam e a partir da sua paróquia recolhia-se o que fosse preciso para cobrir as necessidades reais de muitas famílias. Explicava-nos, este morro (Ramadita) é de fácil acesso e a ajuda concentrou-se aqui, mas que havia outros locais onde era difícil chegar e as pessoas não tinham recebido ajuda. Logo que se tinha terminado de remover os escombros dessas zonas os voluntários tinham diminuído muito. Durante o dia chegavam muitas pessoas de todo o tipo aos morros e para evitar mais problemas fizeram uma restrição de veículos entre outras medidas. Por todo o lado, ele carregava um camião e vários carros com todos os pacotes arranjados na paróquia durante o dia e faziam várias viagens noturnas levando ajuda aos outros morros. As pessoas, na sua maioria, não queriam abandonar os seus sítios e encontravam-se a dormir ao relento ou em tendas. Ele dizia-nos: “as pessoas não querem mais massa. Elas não têm panelas, não têm gaz, não têm um fogão para cozinhar”. Esta era a situação. No meio deste ambiente não havia cabeça para pensar na Sexta-feira Santa, o pároco não celebraria a Liturgia da Cruz, nem participaria na Via-Sacra que rezariam as pessoas da sua paróquia.

Liturgia da Cruz

A primeira coisa que fizemos foi arrumar o salão paroquial. Havia que separar toda a roupa de cama da roupa de vestir. Em 40 minutos o salão parecia outro. A seguir, decidimos fazer uma liturgia da Cruz convidando os paroquianos que afincadamente trabalhavam. Todos, era notório, tinham estado a trabalhar a semana inteira e pensámos que não podiam negar-se a interromper o trabalho por 15 minutos para acompanhar Jesus crucificado. Foi uma liturgia muito linda, singela. Nas petições pedimos por todas as pessoas que tinham sido afetadas pelo incêndio.

Uma surpresa maravilhosa tinha preparado a Mater ao entrarmos no templo para arranjar tudo para a liturgia. No centro, de cada lado da Virgem de Andacollo, estavam uns números muito bem feitos com as seguintes datas: 1914-2014, em letras douradas lia-se “cem anos junto a ti”. Não podia ser casualidade… cem anos, as mesmas datas. Descobrimos que a paróquia também celebrava os seus 100 anos, cem anos desde que foi consagrada em 1914 à Virgem de Andacollo. Não tínhamos dúvidas de que a Mãe nos tinha trazido até ali!

Em seguida, os ministros pediram-nos ajuda para as estações da Via-Sacra e acedemos com gosto. 14 estações e um grande número de pessoas caminhava pelos caminhos retorcidos do morro Ramadita rezando junto a Jesus. Cada estação era uma casa muito bem adornada com uma altar para Jesus. Ficámos espantadas com a religiosidade deste morro, encontrámo-nos com pessoas de fé profunda e viva.

Uma sopa quente

Ao chegarmos, era já hora de jantar e começámos a fazer uma sopa para levar às pessoas nos morros. Sem saber se seria necessário. Levámos, de Santiago, dois fogões e dinheiro para uma botija de gás. No centro de recolha encontrámos todo o tipo de verduras para fazer uma rica sopa quente que levaria sabor de lar a tantos. Descascar batatas, picar cebola, ferver água etc., cozinhávamos ativamente para levar tudo pronto.

Começaram as viagens de carro, seguimos a caravana que circulava com rapidez pelos morros. Passámos por caminhos de terra passando guardas militares até chegar ao morro lo cañas. Ali, no meio da noite, vimos os lugares mais arrasados pelo incêndio, escombros, cinzas, enquanto todos trabalhavam tentando aproveitar o que tinha restado. Ali começámos a repartir a nossa sopa. Correu tudo bem, as pessoas estavam muito gratas. Com a sopa começaram a aproximar-se muitas pessoas que pudemos ouvir e acolher. O dia terminou muito tarde, cansadas mas agradecidas de poder estar ali ajudando tanto.

Uma lição de fé

No dia seguinte, Sábado Santo, ficámos na paróquia. Depois de começar o dia com a oração da manhã pusemo-nos a ajudar na paróquia, onde o trabalho era muito.

À tarde, pegámos nas nossas Mães Peregrinas e fomos missionar pelos setores afetados do morro Ramadita. Ao princípio não nos atrevíamos a dizer muitas palavras. As necessidades materiais eram tão evidentes, que tudo o resto parecia supérfluo. Como falar de Deus quando, aparentemente, nada fala d’Ele. A que portas tocar se não havia portas! Mas a Mater ofereceu-nos uma lição de fé que não esqueceremos facilmente. Tirámos a imagem peregrina do saco e simplesmente caminhámos com Ela, ou melhor, Ela connosco. Maria, a Rainha da Esperança, que crê na vida depois da morte, que crê que o seu Filho ressuscitará, queria estar ali para acolher tantos corações sedentos de busca de sentido. Passado pouco tempo, aproximou-se uma pessoa para que fôssemos benzer uma senhora doente. Entrámos numa tenda e aí fizemos uma oração. A seguir, aproximou-se um homem muito devoto da Virgem que nos pedia orações pela sua mãe. Depois uma voluntária dizia-nos que era tão bom ver a Igreja ali presente e pedia-nos que voltássemos a celebrar uma Missa. Mais além, uma conversa com um homem que acreditava que tudo aquilo tinha um sentido profundo para nos aproximar mais de Deus, etc. A cada passo era o próprio Jesus que saia ao nosso encontro para partilhar a fé, para conversar sobre o sucedido, para elevar uma oração, pedir, agradecer. Sim, é verdade muitos podem ter ajuda material de todo o tipo, e é muito necessária, mas há algo mais para dar: a fé, a esperança e esse ardor que experimentamos pela Aliança de Amor e que é caminho e ponte segura até Deus. Esse Deus que todos procuram, do qual todos temos necessidade, que está mais próximo do que pensamos mas que necessita de instrumentos que o façam visível.

Uma Páscoa que nos ficou gravada para sempre

À noite participámos da Vigília Pascal com a Paróquia. Uma Vigília muito completa, com as 9 leituras e todos os salmos bem cantados. No final da Missa, o pároco disse-nos algo que nos surpreendeu. Agradeceu-nos dizendo “alguns pensarão que este grupo não fez muito (não removemos escombros nem nada desse tipo de trabalhos), mas a verdade é que fizeram muito. Elas rezaram muito e vieram dar espírito ao que fizemos porque sem a oração todo o nosso trabalho carecia de sentido”.

Depois da Missa celebrámos a Páscoa, uma Páscoa que nos ficou gravada para sempre. Mais do que pudemos dar foi muito o que pudemos receber, sobretudo uma ressurreição para a nossa fé, para crer mais na nossa Aliança de Amor, essa que nestes cem anos deu vida à nossa família e que devemos oferecer para que sejam muitos os que encontrem por Maria o caminho para Cristo ressuscitado.

Original: Espanhol: Trad.: Maria de Lurdes Dias, Lisboa, Portugal

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