Posted On 2013-03-24 In Vida em Aliança

INÍCIO DO PONTIFICADO. PAPA FRANCISCO: “NÃO TENHAM MEDO DA TERNURA”

ROMA, VIS.Custodiar, cuidar, com ternura. Esta é a vocação de todos nós. É a mensagem do novo Papa. Quem sabe, são suas linhas de governo. Mensagem clara, simples, profunda, comprometida. Dita em italiano, em não mais que vinte minutos. E a Praça de São Pedro permaneceu pensativa, até o final da celebração (isso às 11h20m da manhã). O reconhecimento do novo Papa era visível entre as mais de 200.000 pessoas que acompanhavam a missa do início do Pontificado; parecia até que pretendiam “fazer a ola”.

 

“É um Papa que chama a atenção. Inclusive, se antecipa. Ao menos hoje, foi assim”, disse, em alemão, um católico, já avançado em idade, que ficou horas diante de uma telão, na Via da Conciliação, presenciando como, pouco a pouco, chegavam as milhares de pessoas. Tinha razão. Foi a primeira improvisação. O jipe apareceu na Praça de São Pedro perto das 8h50m. De pé, Papa Francisco, sorridente, com sua batina branca, sua capa, sua cruz peitoral (a mesma que usava por ser bispo), e com sapatos pretos (não vermelhos)… Abençoando a cada passo, saudando a todos. E as pessoas a correr com suas bandeiras, com seus filhos, seus amigos, seus enfermos… E então, de repente, Francisco acolheu um bebê em seus braços e, para o maior assombro de todos, desceu de seu papamóvel – “O que está acontecendo?”, perguntavam alguns. O novo Papa havia visto um enfermo e quis acariciá-lo e abençoá-lo.

Um telefonema para Buenos Aires

É o novo Papa. O argentino, o primeiro Papa americano, o primeiro Francisco, agora líder da Igreja católica, que hoje se apresentou ao mundo e em poucos dias provocou tantas pessoas. O povo já o reconhece como o Papa “próximo”, “simples”, “que é como um pai”, que saúda com “boa tarde” e depois se despede com um “bom almoço”. O Papa que, à primeira hora desta manhã, telefonou para sua terra natal, onde seus compatriotas o acompanhavam, da Praça de Maio de Buenos Aires; com o telefone à mão, diretamente, surpreendeu a todos deixando uma mensagem: “Não tenham medo”. As mesmas palavras que, em 1978, disse um de seus antecessores, o Papa polonês Karol Woytila.

O Pescador

É a primeira vez que Francisco chega à Praça no papamóvel. E as pessoas querem vê-lo bem, mais de perto, melhor… O novo Papa passa e volta a passar em torno das colunas… talvez, seja o caminho mais longo que até hoje foi feito por um Pontífice Romano no jipe, percorrendo o que, há mais de 21 séculos foi o Circo de Nero, local onde, segundo assegura a história e como confirmam os investigadores de nosso tempo, foi martirizado Pedro, o pescador, o primeiro Papa da Igreja Católica, e cujos restos mortais estão enterrados no mesmo solo. Entre o cenário primitivo, está o grande obelisco, talvez o único que continua em pé; foi trazido de Heliópolis para Roma, por ordem do imperador Calígula. Ao redor desse obelisco, centenas de operários trabalharam durante toda a noite para a data histórica.

Hoje, vinte séculos depois, os testemunhos são outros, e outro é o espetáculo, ainda que o protagonista volte a ser um “homem comum”: Jorge Mario Bergoglio, argentino, 76 anos, Técnico Químico. Seus seguidores podem totalizar 1.165.714.000, número oficial de católicos que existem no mundo (uma de cada 6 pessoas que existem no mundo). E, desta vez, nos “terraços”, estão homens e mulheres que vieram de mais de 127 países do mundo; vieram “porque assim queriam”, como insistiu a Santa Sé: “O Vaticano realmente não convida uns ou outros; o Vaticano informa a todos e oferece uma calorosa acolhida àqueles que chegam, sem favorecer nem rejeitar ninguém”. E, assim, compareceram 6 reis, 3 príncipes herdeiros, 31 chefes de Estado, 11 chefes de Governo… E mais de 1.200 sacerdotes ou seminaristas e 250 bispos católicos… Porém, é impossível contabilizar o número de homens, mulheres, jovens, crianças e idosos: de todas as condições, fé, idioma, cultura, categoria, estado civil, opinião.

Na cerimônia, e apenas como resumo, podem ser citados: o patriarca ecumênico Bartolomeu I; o católico armênio de Etchmiadzin, Karekin II; o metropolitano Hilarion, do Patriarcado de Moscou, o arcebispo anglicano, Sentamu; o Secretário do Conselho Ecumênico da Igreja, Fyske Tveit,… E os 16 judeus, rabinos, das comunidades hebraicas mais importantes do mundo, e líderes de outras religiões, como a muçulmana, budista, sikh, jainista.

“Tu és o pastor das ovelhas”

No alto do chamado “braço de Carlos Magno”, as câmeras de alguns dos aproximadamente 6.000 jornalistas que cobrem o evento. Ali, eles esperaram o amanhecer. Alguns chegaram às quatro horas da madrugada. Muitos deles terminam, assim, seu trabalho diário em Roma; entre muitas atividades, acompanharam o briefing do Diretor da Sala de Imprensa da Santa Sé, Pe. Lombardi, a quem, ontem, ofereceram um favor em agradecimento.

E começa a cerimônia. Começa dentro da Basílica, com a veneração a São Pedro, em seu túmulo, com a presença, claro, do Santo Padre Francisco, que para esse importante momento quis estar acompanhado de 10 patriarcas arcebispos das principais igrejas católicas orientais. Apenas eles. Por quê? Talvez para assim manifestar a universalidade da Igreja católica, com dois ritos – oriental e latino – iguais na essência e na dignidade. Dali, do túmulo de São Pedro, é enviado o evangeliário, erguido ao alto – como pede a liturgia – o pálio papal e o novo anel de pescador.

Do lado de fora, na Praça, a Santa Sé colocou, à direita do altar, as personalidades eclesiásticas não concelebrantes; à esquerda, as autoridades politicas e civis. Um protocolo cuja primeira norma não é a riqueza, mas, sim, a beleza. No esplendor dos cânticos, entoados pelo Coro da Capela Sistina e da Academia Pontifícia do Instituto de Música Sacra. O primeiro canto gregoriano foi “Cristo é Rei!”. Já na missa, durante o ofertório, foi escolhido um moteto de Pierluigi da Palestina, uma peça composta para essa celebração: “Tu és o pastor das ovelhas”. Depois, outras melodias, entre elas uma do maestro Vitoria, além do canto das ladainhas dos santos, concluída com os últimos três papas santos: Gregório VII, Santo Pio IX, Santo Pio X.

Símbolos e gestos

Dois são os momentos mais importantes da cerimônia que se desenrolam antes que a Missa comece. São os ritos pelos quais Jorge Mario Bergoglio passará a ser o Papa Francisco. O primeiro é a imposição do pálio: confeccionado de lã de ovelha, o Santo Padre o recebe do cardeal protodiácono (o mesmo que, do balcão de São Pedro, anunciou seu nome). Representa o cuidado que o bom pastor deve ter para com seu rebanho, para com suas ovelhas, para com a Igreja (com letra maiúscula).

Depois, o decano dos cardeais, Angelo Sodano, entregou a Francisco o “anel do pescador”, cravado com a imagem de Pedro segurando as chaves. É de prata dourado. Foi confeccionado pelo artista Enrico Manfrini. Porém, não foi feito ou comprado agora. Pertencia ao monsenhor Macchi, amigo dos artistas, e que foi secretário de Paulo VI. Depois, o anel passou a pertencer a outro monsenhor, Malnati; e este ofereceu ao cardeal; finalmente, o novo Pontífice Romano quis usá-lo.

Por último, entre esses ritos, o ato da promessa de obediência ao novo Papa: seis cardeais, dois de cada vez. E onde estão os outros representantes do Povo Santo de Deus? Os católicos, em pé, oferecerão esse gesto de obediência ao novo Papa na catedral de São João de Latão, em uma cerimônia prevista para os próximos dias.

“Não devemos ter medo da bondade, da ternura”

Começa a Santa Missa, seguindo a liturgia da Solenidade de São José, Patrono da Igreja Universal. Concelebram 180 cardeais, os patriarcas das igrejas católicas que são cardeais, o secretario do colégio cardinalício, e dois sacerdotes, os dois espanhóis, que ocupam o cargo de presidente e vice-presidente de União de Congregações e Ordens Maiores: o franciscano Carballo e o jesuíta Adolfo de Nicolás, o Superior de Francisco até 13 de março último.

O Evangelho, momento culminante da liturgia da Palavra, foi proclamado em grego, em deferência ao rito oriental. Depois, a homilia do Papa Francisco, em italiano. Na praça, reina um profundo silêncio. O Santo Padre, muito tranquilo. “Parece que sempre foi Papa”, comentam as pessoas na praça, ao escutarem suas primeiras palavras. O texto foi entregue pela Sala de Imprensa da Santa Sé com antecedência, porém com um aviso: “Este Papa ama improvisar. Fiquem muito atentos!” Não, o Papa Francisco não improvisou.

O Papa fala de São José, coloca-o como exemplo, descreve sua vocação e ressalta sua fidelidade e disponibilidade; comenta como soube escutar a Deus, como esteve atento a tudo o que acontecia à sua volta… Este é o preambulo de seu discurso. Depois, segue o núcleo da homilia, quando o Papa Francisco liga essa vocação à vocação de todos, à vocação de cada um, também à sua própria vocação. E conclui com um brilhante final: a responsabilidade de custodiar (cuidar) com ternura, de não destruir o que recebemos: desde a criação, até a nós mesmos, aos que nos rodeiam, e especialmente aos mais pobres. “Não devemos ter medo da bondade, da ternura”, afirma o Papa Francisco. “Porque todos somos chamados a fazer brilhar a estrela da esperança: protejamos com amor a tudo o que Deus nos deu”. Assim concluiu sua homilia o novo Bispo de Roma; a homilia do início de seu pontificado.

Na Praça de São Pedro, fez-se silêncio. “Estamos calados, mas, por dentro, o vulcão está em plena erupção”, comenta um jovem, um dos muitos jovens italianos que vieram até aqui trazendo seus filhos e, em alguns casos, bebês ainda. Ao seu lado, um grupo que vem do Líbano, pessoas que ainda lembram as viagens àquele país que João Paulo II e Bento XVI fizeram. “Francisco também irá. Estamos certos disso!”.

Ao final, terminando a missa (uma liturgia bela, com alguns partes cortadas para não ficar muito longa, como foi a vontade de Francisco), o Papa dirigiu-se para rezar diante da imagem da Virgem, que presidiu toda a cerimônia. Depois, já os gritos do povo: Francisco! Francisco! Francisco!, os cânticos gregorianos, e os sinos de São Pedro que “animam a festa”. O recém Santo Padre voltou a entrar na Basílica, onde estavam os ornamentos sagrados; e diante do Altar da confissão, recebeu a saudação dos representantes diplomáticos de 132 países e de diversas organizações presentes à missa. Duas horas de saudações. As principais delegações foram as da Argentina (liberada pela presidenta Cristina Fernández de Kirchner e mais 19 pessoas de seu Governo); da Itália, com seus presidentes à frente: da República, do Governo, do Senado, do Congresso e do Tribunal.

Já nos próximos dias, o Padre Francisco terá que resolver como responder aos milhões de e-mails que já recebeu. E isso que ainda não existe um endereço oficial.

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Fotos

Original: Espanhol – Tradução: Maria Rita Fanelli Vianna – São Paulo / Brasil

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