CHILE, José María Fuentes •
A história de Jesus chega até nós através dos quatro evangelistas; ela nos dá a visão da vida de Jesus que a Igreja considerava autêntica desde o início. Sem dúvida, aqueles que condenaram Jesus ou testemunharam contra ele tinham outra visão. Os Evangelhos apócrifos refletem uma visão diferente de outro grupo de apoiadores de Jesus. —
Elaboração da história
Von Teuffenbach, em seu livro “O pai pode fazê-lo”, constrói uma imagem do Pe. Kentenich a partir dos testemunhos de 10 ex-Irmãs de Maria e 3 Padres Palotinos que estavam contra ele. Seu texto não corresponde a uma historiografia (um estudo histórico com diversidade de fontes), a um acervo documental (já que na primeira parte e antes do aparecimento de cada documento, ela faz interpretações para predispor anímica e intelectualmente o leitor).
Com habilidade e inteligência, a autora gera simpatia e identificação com as antigas irmãs e animosidade com o Pe. Kentenich. Através dos testemunhos dos sacerdotes acentua a imagem de que o Pe. Kentenich era um homem que não sabia como ouvir ou integrar opiniões contrárias às suas. Como a autora reconhece, obteve a maioria destas informações de um arquivo que o Pe. Heinrich Maria Köster, um palotino que se opôs ao Pe. Kentenich, elaborou contra ele em meados dos anos 70 e que complementou nos anos 80.
A história do Pe. Kentenich chegou até nós através de vários testemunhos e trabalhos de documentação. As biografias que os Padres de Schoenstatt elaboraram após sua morte foram relevantes. Os padres Alessandri, Uriburu, Monnerjahn e Niehaus escreveram biografias diferentes entre o início dos anos 70 e o final da primeira década deste século. Christian Feldmann, um jornalista católico que não é schoenstattiano, escreveu outra biografia em meados dos anos 2000. A Irmã Schlickmann escreveu em meados dos anos 2010. Somente os dois últimos dizem, em algumas frases, que os resultados das visitas se devem, em parte, à participação de irmãs críticas ao Pe. Kentenich.
Reflexão
Para o Pe. Kentenich, a experiência de Deus, e com ela a possibilidade de seu verdadeiro desenvolvimento, depende, de forma importante, das experiências humanas que as pessoas vivenciam ao longo de sua vida. Embora este conceito tenha se desenvolvido ao longo do tempo, certamente esteve presente desde o início. Em 1912, no início de seu trabalho, convida os seminaristas palotinos sob seus cuidados a trabalharem juntos para se desenvolverem como personalidades livres, firmes e sacerdotais. Ele complementa isto dizendo-lhes que lhes dará todo o seu coração, o que lhes facilitou o desenvolvimento e lhes permitiu experimentar a companhia e o afeto de Deus através dele. Isto os ajudou enormemente a lidar com a experiência traumática das trincheiras na Primeira Guerra Mundial. Esta atitude e experiência foram ampliadas e aprofundadas ao longo dos anos. Embora isto não tenha sido exclusivamente com as Irmãs de Maria, elas certamente desempenharam um papel importante como comunidade. Com elas ele mesmo se experimentou, de forma intensa, como pai e também pôde ver os efeitos positivos que esta experiência estava produzindo nelas.
O estilo e as práticas que são objeto de controvérsia neste momento, e que também foram objeto de controvérsia na visita da Diocese de Tréveris e posteriormente na visita do Santo Ofício, estão relacionados com a experiência e o desenvolvimento das Irmãs. Experimentar-se como aceito e amado por Deus com todas as limitações e deficiências é uma experiência central no desenvolvimento humano e religioso; o significado destes atos foi esta experiência de aceitação e a entrega total da pessoa a Deus como uma resposta.
Para as Irmãs de Maria, o tema da visitação e do exílio sempre foi um tema difícil de ser tratado. É claro que elas sofreram muito durante esses anos. Elas experimentaram a hostilidade, e muitas vezes o tratamento brusco, do Pe. Tromp (o visitador do Santo Ofício) e dos palotinos que se opunham a Schoenstatt. A separação forçada do Pe. Kentenich também foi muito dolorosa. O prestígio do Pe. Kentenich e delas mesmas – tal como agora – foi violentamente atacado. Tudo isso nós pudemos ler e ouvir há muito tempo.
O que aprendemos nos últimos meses é que houve um grupo de irmãs (cerca de vinte) que teve conflitos com o Pe. Kentenich e que falou contra ele nas visitas. Tivemos também acesso, como resultado das acusações de von Teuffenbach, a alguns costumes e estilos das Irmãs.
É compreensível que as Irmãs tenham tido pudor em dizer que um grupo delas foi em parte a razão para o exílio do Pe. Kentenich e reserva em ter detalhes íntimos de sua vida comunitária tornados públicos.
A questão é que as acusações mudaram o quadro. O que Deus quer nos dizer? O que Ele quer dizer às Irmãs? Como Ele nos convida a enfrentar a destruição sistemática da imagem do Pe. Kentenich? Por que Ele permitiu isso?
No final dos anos 40, o Pe. Kentenich queria que a experiência de Schoenstatt, que havia se mostrado sólida para enfrentar os difíceis desafios da época, fosse conhecida e utilizada pela Igreja. Por esta razão, convidou o Bispo de Tréveris para visitar Schoenstatt, especialmente as Irmãs de Maria, na esperança de que entendesse os processos de vida que estavam ocorrendo ali. O bispo transformou este convite em uma visita canônica e, embora tenha elogiado os resultados obtidos no desenvolvimento das Irmãs, não aprovou muitas das estratégias pedagógicas do padre Kentenich, com o qual começou o duro confronto.
Oportunidade que nos abre a Providência
A situação atual é uma nova oportunidade que a Providência nos abre para mostrar a riqueza de Schoenstatt, sua pedagogia e espiritualidade para a Igreja de hoje e, de uma maneira muito especial, para a sociedade atual. Era exatamente o que o Pe. Kentenich queria originalmente. Para fazer isto teremos que fazer um movimento para trás e outro para frente.
Para trás significa recapitular a história. Para fazer uma historiografia nova, mais profunda e detalhada de todo o ambiente de 31 de maio de 1949, especialmente o que aconteceu entre a saída do Pe. Kentenich do campo de concentração de Dachau (1945) e o fim da visita do Santo Ofício (1953). Para isso, é necessária uma participação especial das Irmãs de Maria, pois são elas as que possuem os melhores arquivos da época. É vital, para se ter um quadro completo, ter acesso e saber o que a maioria delas experimentou nesta etapa de suas vidas. Permanecer apenas com os testemunhos daquelas que se opuseram ao Pe. Kentenich é uma injustiça para com ele. Seria muito valioso ter os testemunhos das irmãs que permaneceram na comunidade, que foram felizes nela e que se identificaram como filhas espirituais do padre Kentenich. Talvez existam diários pessoais de irmãs que morreram, mas o certo é que existem crônicas de cursos, casas e províncias. Dentro deste trabalho, a experiência subjetiva de sofrimento que estas antigas irmãs tiveram com a comunidade e com o Pe. Kentenich deve ser integrada. Para fazer este trabalho, que não pode ser limitado apenas às irmãs, será necessário olhar criticamente para o passado e ver que o Pe. Kentenich, em seu caminho para a santidade, estava aprendendo. Isto significa que, em suas práticas pedagógicas, ele teve êxitos e fracassos; às vezes estava certo no que fazia, e em outros casos, estava errado.
Mas não basta olhar para trás, Schoenstatt é uma iniciativa de Deus para dar uma resposta para o futuro. Por que estudar as acusações contra o Pe. Kentenich se isto não tem uma consequência prática? A corrente de graças que começou com a Aliança de Amor do Pe. Kentenich com a Mãe de Deus no Santuário de Schoenstatt em 18 de outubro de 1914 é chamada a se projetar no transcurso do tempo. Existe para responder às pessoas de nosso tempo, que vivem ao nosso lado, em nossas cidades, nossos campos, nossos locais de trabalho, nossas casas e em todos os lugares onde as encontramos; também para aqueles que não encontramos. Como respondemos aos tempos de hoje? O que Deus nos convida a fazer em 2021? Como participamos e facilitamos a fecundidade desta corrente de graças?
Se olharmos honestamente para nós mesmos, devemos reconhecer que há muito a fazer (ou que deveríamos ter feito) e que se não o fizermos, os frutos deste fluxo de graça não serão o que deveriam ser.
Há pelo menos três áreas nas quais somos chamados a fazer um esforço para melhorar o acima exposto: responder aos desafios dos tempos, ter uma forte ênfase no serviço tanto aos próximos como aos distantes (especialmente aos necessitados) e aprender a compartilhar e trabalhar com os outros (entre nós, com outras comunidades, com outros tipos de pessoas, etc.). Como este é um tema longo, vou abordá-lo em um artigo futuro.
Original: Espanhol (13/04/2021). Tradução: Luciana Rosas, Curitiba, Brasil