Posted On 2020-07-15 In José Kentenich

O meu testemunho no que diz respeito às acusações da teóloga Alexandra von Teuffenbach

Por Patricio Ventura Juncá, Chile •

As acusações de abuso de poder e mesmo abuso sexual contra o nosso Fundador, Padre José Kentenich, contidas na carta pública da teóloga Alexandra von Teuffenbach, despertaram, justamente, a atenção e a preocupação de todos os membros da Família de Schoenstatt. Li, com especial interesse, o que foi escrito até agora pela Presidência Internacional, pelo Superior dos Padres de Schoenstatt em Espanha, pelas Irmãs de Maria, bem como vários comentários dos leigos. —

Para aqueles que já tinham alguma noção anterior à cerca destas acusações não foi uma grande surpresa, mas para aqueles que não as conheciam, que são a maioria, despertaram dúvidas e interesse em conhecer a verdade. Encorajado por pessoas da nossa Juventude e Casais que conhecem o meu encontro com o Padre Kentenich em Milwaukee durante os meses de Janeiro e Fevereiro de 1964, altura em que a relação entre o Fundador e o Santo Ofício se encontrava em máxima tensão, dou este testemunho para colaborar no esclarecimento da verdade dos factos.

Por circunstâncias providenciais, como seminarista de Schoenstatt na Comunidade pallotina, viajei com o Padre Aquiles Rubin, brasileiro, para Milwaukee no final de 1963 e vivi na Paróquia de Holy Cross, onde se encontrava o Padre Kentenich, até ao início de Março de 1964. Obtive a autorização dos meus Superiores para fazer esta viagem com a ideia de aperfeiçoar os meus estudos em filosofia moderna na Universidade Marquette (Milwaukee). No entanto, os meus verdadeiros objectivos eram conhecer o Fundador e fundamentalmente falar com ele sobre a minha vocação e sobre as diferentes interpretações relativas à missão do 31 de Maio, que nessa altura criava tensões na Família de Schoenstatt. A minha experiência pessoal com o Pai e Fundador, que foi a parte mais importante da minha estadia, contei-a internamente à Família de Schoenstatt em várias ocasiões.

Gostaria, no entanto, de salientar alguns aspectos da atmosfera que vivi com o Fundador. A coisa mais impressionante para mim foi conhecer uma pessoa que, como nunca antes, me transmitiu a proximidade de Deus fundamentalmente como Deus Pai, que é próximo, sábio e misericordioso. O Pe. Kentenich irradiava muita vida, alegria e uma liberdade contagiante que experimentei profundamente. O que me aconteceu foi o que um advogado de Lyon relata quando conheceu o Cura d’Ars quando disse “Eu vi Deus num homem“. No Pe. Kentenich encontrei uma pessoa simples e sábia, com quem convivi diariamente na sua Missa, ao pequeno-almoço e também em algumas conversas. Perguntei-lhe tudo quanto me vinha à cabeça. O Pe. Kentenich ouviu tudo e ajudou-me na minha vocação e desenvolvimento espiritual e com muito respeito e sabedoria no meu processo de encontrar o meu Ideal Pessoal.  Isto marcou-me para sempre e tem sido a chave para assumir, com confiança, as tarefas que, em todas as áreas da minha vida, na minha família, no trabalho, no Movimento e na Igreja, a Providência tem vindo a mostrar-me.

Foi como resultado do meu interesse em compreender a história e a centralidade da missão do 31 de Maio que um texto do Pai e Fundador com o título: “Sobre a Visitação Apostólica” chegou às minhas mãos (fornecido pelo Pároco schoenstatteano da Santa Cruz, Padre José Haas). O Padre Kentenich não podia falar sobre isto por causa da proibição do Santo Ofício. O documento estava em alemão e o Padre Aquiles traduziu-mo e eu tomei notas. Neste documento, escrito pelo Fundador, tomei conhecimento do tema das acusações do Visitador, Padre Sebastian Tromp, contra o Padre Kentenich e a sua doutrina. Para compreender como se chegou a tais acusações e o que o Pai a elas respondeu  neste documento, é indispensável conhecer primeiro o contexto histórico do porquê da Visitação Apostólica, quais foram as conclusões do Visitador, as suas consequências e a resposta do Padre Kentenich. Fá-lo-ei citando deste documento apenas os textos mais pertinentes que facilitam a compreensão do tema que tem estado sobre a mesa, ou seja, as acusações do Visitador.  Os textos citados do documento do Fundador estão em itálico.

Como se chegou à Visitação Diocesana e depois à Visitação Apostólica

“A origem da Visitação Diocesana deve ser compreendida e justificada dentro da história de Schoenstatt. A Família vivia a corrente da vida que foi fruto do 20 de Janeiro, de Dachau e da perseguição nazi. Isto mostrou preclaramente Schoenstatt como uma Obra e um instrumento especial de Deus para as necessidades do nosso tempo.  Esta é a atmosfera da Família, a partir de 1945. Isto trouxe duas coisas:

a) A necessidade de conhecimento e reconhecimento oficial da Igreja, para apresentar Schoenstatt aos Bispos.

Esta é a origem, como diz o Pe. Kentenich, da Visitação Diocesana.

  “b) O desenvolvimento internacional: Viagens do Pai”.

Na sequência do desenvolvimento do texto citado, a importante questão a responder é:

O que resultou da Visitação Diocesana?

 “O relatório do Visitador sobre a vida e a doutrina das Irmãs Marianas é positivo. Ele faz apenas algumas observações que considera pequenas. No entanto, o que o Fundador (aqui fala o Padre Kentenich na terceira pessoa) esperava era a aprovação do seu grande desejo, que se esconde por detrás de toda a vida e costumes das Irmãs: o “Homem orgânico”, que quer ser a resposta para o mecanicismo que infesta o espírito em toda a parte.

O Homem organicamente estruturado que aceita internamente e se pronuncia positivamente por todos as Vinculações queridas por Deus na Ordem Natural e Sobrenatural; ele vê-as na melhor e mais harmoniosa união e tenta realizá-las da melhor maneira.Com isto está descrito o grande desejo do Fundador em termos gerais, que é também o do Concílo”.

No documento, o Padre Kentenich estende-se muito mais sobre isto, o que creio que deveria ser bem conhecido por um schoenstatteano. Se o Pai tivesse aceite as pequenas observações, provavelmente nada mais teria acontecido e a Visitação Apostólica e o exílio teriam sido evitados.

“O Fundador tentou tornar o Visitador Diocesano também consciente deste grande desejo. Para o efeito, expressou-o primeiro verbalmente, e depois numa resposta oficial escrita no dia 31 de Maio em Santiago, Chile. O estudo trata do seu grande desejo pelo Homem Novo que superará o pensamento mecanicista, alertando para o envenenamento das fileiras católicas devido a isso.  A primeira parte foi escrita no Chile. O trabalho teve efeito, e produziu uma reacção contrária que terminou na Visitação Apostólica“.

Neste contexto, insere-se a palestra de 31 de Maio de 1949, que é uma premonição do que aconteceria, cito a palestra: “Mas temos de contar que, com este trabalho se fira corações nobres no nosso país, desperte a indignação violenta e faça contra-ataques fortes e duros em resposta. Não nos admiremos se uma frente poderosa e unida de homens influentes se forme contra mim e contra a Família”.

A Visitação Apostólica e os seus resultados

“Também em Roma, o estudo não foi compreendido e aceite. 

O Visitador Apostólico não mostrou qualquer interesse no problema proposto.

É possível que agora a situação possa mudar, uma vez que o Concílio já tratou das mesmas coisas. Devemos notar que no desenvolvimento da Visitação, o Visitador eliminou todos os escritos que expunham a missão específica de Schoenstatt. Foi o caso das conferências de Quarten que explicavam os costumes das Irmãs de Maria e com a resposta do 31 de Maio. O Visitador estava interessado em levar Schoenstatt para o plano dos Movimentos religiosos que estão, especialmente, orientados para as “antigas praias” e que não têm significado para os novos tempos, que não se sentem chamados a formar a nova estrutura do mundo e da Igreja. O Movimento foi julgado dentro das categorias antigas”.

O Kindesexamen: exame de filialidade e a sua verdadeira interpretação

Foi o tema central das observações do Visitador e é retomado por Alexandra von Teuffenbach, que também dá a sua própria interpretação.

O P. Kentenich refere-se primeiro à interpretação verdadeira e depois à interpretação errada.

“Tentemos primeiro esclarecer qual é o conteúdo autêntico dos Kindesexamen.  É uma repetição original do exame de amor e humildade, que S. Pedro fez quando foi nomeado Primado. É a flor e fruto de uma educação apaixonada ao longo de muitos anos. Inclui,  particularmente, quatro perguntas:

1.- A quem pertence o filho?  – Pertence ao Pai

2 -O que deve o Pai fazer com o filho? – Tudo

3.- O que é o Pai para o filho? – É tudo

4.- O que é o filho para o Pai?  – O seu pequeno nada e, portanto, o seu tudo”.

O pai comenta longamente esta questão, mas ao mesmo tempo assinala que é nas conferências de Quarten (Suíça) que tudo isto é explicado em maior profundidade.

É por isso que estou apenas a copiar alguns parágrafos do documento que estou a citar:

“Quem recebeu profundamente o pensar orgânico, pode compreender o significado disto, e saber que (as perguntas) se referem fundamentalmente a Deus, o Pai. Também, numa forma secundária e secundum quid, a figura do pai terreno é incluída na medida em que ele participa na autoridade de Deus.

Toda a educação das Irmãs durante muitos anos perseguiu sempre este fim:

Compreender todas as causas segundas num conjunto orgânico. Isto é da maior importância neste caso, uma vez que toda a educação é orientada de uma forma patrocêntrica, como dificilmente se pode encontrar noutro lado. A palavra Pai é para elas um mundo inteiro. Isto pelo pensar orgânico está associado a ambas as coisas:  Causa primeira e causa segunda.

As palestras de Quarten que o explicam são um documento de excepcional pureza de coração e intocabilidade de toda a personalidade.

Para proteger o exame de falsas interpretações, deve ser sempre reservado na Família, até ao último paternal ou maternal da Família, e só eles podem recebê-lo. (Trata-se de este costume ser realizado por aqueles que verdadeiramente compreendem o seu significado como uma doação filial de si mesmos a Deus Pai)

A entrega de si mesmo a Deus Pai é sempre o ponto de descanso, tranquilidade e o fim, tanto na espiritualidade da Aliança, do dia de trabalho como na espiritualidade do instrumento. Deus Pai é sempre o ponto de Arquimedes em torno do qual gira toda a Família, e é apenas a partir dele que os nossos costumes são compreendidos.

Quem compreende bem a relação entre a causa primeira e a causa segunda vê como a questão dos órgãos é incluída nos Kindesexamen de forma bastante natural e que as falhas na sua interpretação não se devem aos Kindesexamen. Será interpretado injustamente se isto for feito fora da atmosfera de onde surgiu e na qual é legítimo.

Temos de dizer, por uma questão de clareza, que não há nada sobre tentações ou fracassos sexuais neste ponto. A inclusão do organismo físico no Kindesexam não pode ser entendida como algo sexual. Temos de o entender como os bons pais católicos, que não têm problemas em explicar aos seus filhos que os órgãos são bons e feitos por Deus, e que, portanto, pertencem a Deus. Isto é algo que não deveria ser um problema grave. Deus, através dos pais, diz como se deve valorizar, julgar e agir com os próprios órgãos. A pergunta própria sobre o corpo é decidida pelo próprio Deus para todos os tempos. A questão vai no sentido do comportamento correcto em relação aos órgãos. O corpo pertence àquele que o criou. S. Paulo: “O corpo é para o Senhor”. Por conseguinte, Ele tem o direito de determinar o que quer sobre ele”.

 

O Kindesexamen envolve as quatro questões fundamentais acima mencionadas. No entanto, na apresentação do Padre Kentenich ele fala também da pertença do corpo e dos seus órgãos. Na carta de A. Teuffenbach, são mencionadas outras questões sobre as quais não consigo encontrar qualquer informação. Pelo contrário, tenho uma referência válida da Irmã Doria Schlickmann publicada numa entrevista recente sobre a questão que diz: a quem pertence o peito? profusamente repetida nos meios de comunicação social. A isto a Irmã responde, passo a citar:[1]

Isso também é distorcido e incorrectamente publicado nos meios de comunicação social. Todos os que lerem isto irão certamente pensar: Isso é um absurdo!

Esta pergunta diz respeito apenas a um caso. A Irmã tinha um distúrbio de ansiedade muito pronunciado em relação à sua aparência física e por isso tentou desesperadamente esconder as suas formas femininas tanto quanto possível. É de notar que, nessa altura, a educação das raparigas levava frequentemente à agitação sexual e à prudência. O Padre Kentenich deixou-lhe claro e fez-lhe ver a obsessão que ela tinha e queria libertá-la desta compulsão. Com isto, queria deixar-lhe claro que Deus a tinha aceite totalmente como ela era.

A interpretação do Visitador

“Tendo visto a verdadeira fisionomia dos Kindesexamen, não será difícil para nós, agora, manifestarmos as suas falsificações sem gastar muitas palavras. Não é uma questão de entrar em pequenos desvios, ou pequenas divergências. Isto será fácil para nós se chegarmos a um ponto comum, onde todas as falsas caracterizações convergem e compreendê-las na sua lamentável, grotesca e trágica versão.

De acordo com esta interpretação, todos os costumes de que falámos seriam frutos e filhos da psicanálise na sua forma sexualista mais suja. Seriam formas falsas de agir e um claro desvio do pensar, agir e viver católicos.

Dificilmente seria possível fazer uma  pior deformação de tudo isto, e ferir até à morte uma Comunidade ao envenenar todo o seu crescimento.

Como pôde chegar-se a um tal diagnóstico? Na verdade, com a melhor das intenções, seria difícil compreendê-lo e justificá-lo. A exposição objectiva dos Kindesexamen, dificilmente dá para esta interpretação. As palestras de Quarten que o explicam são um documento de excepcional pureza de coração e intocabilidade de toda a personalidade. Como é possível que se reveja nesta psicanálise? Além disso, o acusado em numerosos cursos e conferências tomou sempre uma posição contrária a Freud e à sua interpretação da psicologia. Por outro lado, como sería possível que Schoenstatt fosse reconhecido e admirado por tantas pessoas dentro e fora da Igreja e que fosse capaz de produzir personalidades de líderes com bases pedagógicas tão fracas”?

Causas desta interpretação

“Causas destas interpretações. Perguntamo-nos aqui, qual é a causa de uma interpretação tão duvidosa deste caso?

O Visitador Apostólico é a única causa, e só ele é que trouxe a imagem dos Kindesexamen em relação causal com a psicanálise e Freud. Fica-se surpreendido com a forma como tal interpretação pode ser justificada. Em nome da verdade, devemos mostrar que dois foram os erros fundamentais:

-Primeiro erro: Que tenha  generalizado a aplicação do exame com base numa rara excepção na sua interpretação. Isto é algo que nunca deveria acontecer com um Visitador que representa o Santo Ofício.

-Segundo erro. A sua interpretação do exame como o fruto da psicanálise. Este é um mistério que talvez só mais tarde possa ser esclarecido. Para efeitos deste estudo, devemos mencionar dois pontos no interesse da verdade:

1- O facto de ter manchado a vida moral do Pe. Kentenich não teve  pouca importância no desenvolvimento posterior. Como consequência, a doutrina ia ser posta em dúvida.

De acordo com a praxis da Igreja, os erros de doutrina são muito mais graves, e Ela trata-os com  mais severidade.

  1. sobre a interpretação que faz da doutrina, não pode basear-se em nenhum testemunho. Ele permanece sozinho, totalmente só nesta interpretação e carrega sozinho a responsabilidade perante Deus e perante a história pelas suas consequências. Não há um único documento do Fundador que possa servir de base. Pelo contrário, declarou-se sempre publicamente contrário à Psicanálise e à doutrina de Freud”.

As consequências

“Consequências das falsas interpretações do Visitador Apostólico. As consequências são imprevisíveis. Se pensarmos na sua posição de Visitador Apostólico que representa o homem de confiança do Santo Ofício, apercebemo-nos do que isto significa.

A primeira consequência é a expulsão do Fundador e os grandes sofrimentos que causou aos seus seguidores durante muitos anos até agora.

Segunda, o Santo Ofício seguiu sempre o julgamento do Visitador. Como este julgamento é falso, o mesmo acontece com os decretos. Mas, temos de distinguir entre os decretos e a sua observação. Quanto à observação, ninguém faz dela um problema: a obediência. Mas  outra coisa é assinalar que a sua fundamentação é falsa.

 Terceira consequência: calúnias odiosas que se verificaram na Igreja e Sociedade dos Pallotinos. Calúnias surgidas a partir destas interpretações e que ainda não terminaram

 Na calúnia dentro da Igreja, o Bispo de Trier teve uma influência negativa em todo o lado e nos círculos mais altos da Igreja. Isto é demonstrado em casos muito trágicos na “Apologia pro Vita mea”.

 Na Sociedade dos Pallotinos, é o Padre Geral dos Pallottinos que é o mais responsável, juntamente com os Padres Schulte e Koester”.

Bispos e Padres Conciliares tomam conhecimento da forma como o Santo Ofício tratou o caso do Padre Kentenich e de Schoenstatt.

Durante o tempo em que estive em Milwaukee, visitei o Bispo Manuel Larrain e o Cardeal Raul Silva Henriquez em Chicago, que estiveram presentes numa das primeiras reuniões do CELAM. Aí, eles expressaram-me que já entre vários padres conciliares (bispos e cardeais) havia conhecimento desta situação  e que pensavam que o Padre Kentenich seria libertado em breve. É assim que se compreende o contexto desta última parte do documento em que se expressa:

“É de temer que este caso, quando se tornar conhecido em toda a sua nua e crua realidade  dentro da Igreja, venha a trazer danos ao próprio Santo Ofício. Pode acontecer que as críticas ao Santo Ofício que actualmente não são pequenas, recebam novo alimento pelo facto de o acusado não ter sido informado das acusações, não ter sido ouvido, mas simplesmente condenado”. (Aqui não se refere ao facto de ter havido uma condenação de abuso sexual ou de poder, mas sim aos decretos e proibições do Santo Ofício, que obviamente têm como pano de fundo a visão do Visitador).

Quando eu e o Pe. Aquiles  terminámos de ler este documento, ficámos muito impressionados com a energia e coragem do Pe. Kentenich para esclarecer as coisas e referir os erros da Visitação que fundamentaram os decretos administrativos do Santo Ofício, numa altura em que todos tremiam à sua frente. Eu e o Pe. Aquiles dissemos a nós próprios: “depois disto, a canonização do Pai e Fundador será difícil”. Mas as coisas aconteceram de forma diferente. A 20 de Outubro de 1965, surpreendentemente, a sessão plenária do Santo Ofício decidiu abolir todos os decretos contra o Fundador e transferir a causa para a Congregação para os Religiosos: “Res remittatur ad sacram Congregationem de Religiosis”. A 22 de Outubro de 1965, o Cardeal Ottaviani encontrou-se com o Santo Padre. O Papa Paulo VI confirmou a resolução e assinou o decreto. A 22 de Dezembro de 1965, Paulo VI recebeu o Padre Kentenich numa audiência privada.

O Cardeal Ottaviani, Sub-Prefeito do Santo Ofício no momento em que o relatório do Padre Tromp foi recebido, após os acontecimentos que acabam de ser relatados, referiu-se positivamente ao Padre Kentenich e expressou o seu profundo pesar por ter agido injustamente, mas sem intenção, produzindo grandes dores e sofrimentos à Família de Schoenstatt e ao seu Fundador. Ele levou uma fotografia da Mãe Três Vezes Admirável de Schoenstatt para a Capela do Santo Ofício que eu pude ver e fotografar durante os anos em que fiz parte do Conselho de Administração da Pontifícia Academia para a Vida.  Perguntaram ao Cardeal Ottaviani como era possível que, tendo sido tão contrário a Schoenstatt e ao Padre Kentenich, ele tivesse agora esta mudança de atitude. A sua resposta é também bem conhecida: “Errar é humano, mas persistir no erro é diabólico”.

Um comentário final

Existem numerosos documentos do Padre Kentenich sobre o período da Visitação, o exílio e a sua reabilitação. Alguns deles foram traduzidos para espanhol. Outros não, tais como A Apologia pro Vita Mea. Hoje, documentos e arquivos estão também a ser divulgados, o que permitirá conhecer mais pormenorizadamente o processo da Visitação Apostólica e responder a questões particulares que ficaram por responder. É tarefa de todos os envolvidos colaborar nisto com o rigor que corresponde e esclarecer suposições e conjecturas que, por vezes, provêm de terceiros que não conhecem os factos e documentos originais.

No espírito do nosso Pai Fundador, como ele sempre fez, perguntamo-nos: “O que quer Deus com isto? É uma reflexão para cada um de nós e para as nossas Comunidades.  Por conseguinte, volto ao que o Pai diz no início do documento, a nossa convicção de ver: “Schoenstatt como obra e instrumento especial de Deus para as necessidades do nosso tempo“.  Creio que isto é muito mais válido hoje em dia e é onde Deus nos pede que usemos todas as nossas capacidades e esforços. Embora seja necessário investigar e esclarecer, devemos ter cuidado para que a nossa energia não se esgote no debate que está hoje sobre a mesa, distraindo-nos da parte central da nossa tarefa como schoenstatteanos e cristãos.

A missão de Maria para o nosso tempo, da qual o Padre Kentenich é o grande apóstolo, desafia-nos a seguir o Senhor, chama-nos a procurar com clareza e simplicidade onde estão as necessidades, onde Jesus está nu, onde tem fome, onde está doente… . naqueles pequeninos que passam por nós, naqueles que estão sozinhos e não têm família. É isto que o Papa Francisco nos pede, para levarmos o nosso testemunho e as nossas acções às periferias existenciais

Penso que todos esperamos e confiamos que a dolorosa situação que a nossa Família de Schoenstatt está a viver acabará por fortalecer e estimular o que São João Paulo II nos disse para a celebração do 100º Aniversário do nascimento do Pai em Roma: “Encorajo-vos, pois, a redobrardes  os vossos esforços para serdes, onde a Providência vos colocou, instrumentos de Deus na evangelização da cultura presente e futura”.

Patricio Ventura Juncá T[2]

Original: espanhol (13/7/2020). Tradução: Lena Castro Valente, Lisboa, Portugal

[1] Talvez nem sempre seja aconselhável manter o silêncio”! Entrevista: Heinrich Brehm, PressOffice Schönstatt, 4 de Julho de 2020, Alemanha
[2] Agradecer à minha esposa Marita pela sua ajuda na redacção e correcção do manuscrito. Sem ela, não teria sido possível. Estou também grato a Carolina Domínguez B que foi chefe da Juventude Feminina em Santiago e a Ignacio Rodríguez L. por terem revisto os rascunhos e feito sugestões valiosas para a sua melhor compreensão.

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2 Responses

  1. LINDAURA SILVA FILHA says:

    Muito bem esclarecida, essa explanação nesse documento!

    Que Deus Pai, Pai Deus, tenha misericórdia dessa senhora Alexandra von Teuffenbach, e dos Kindesexamen, os quais aparecem como impostores na causa de Beatificação do nosso Pai Padre José Kentenich!

  2. Lena Castro Valente says:

    Excelente artigo. Explica claramente o pano de fundo do 31 de Maio e o porquê dos diferentes passos e das razões que levaram as partes a seguir tal ou tal caminho. .. Tudo muito claro… Assim como, o “funcionamento interno” da pedagogia Kentenich e as reacções do clero em relação ao Fundador e ao modo como o processo decorreu. Obrigada pelo seu testemunho Patrício.

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