Posted On 2020-01-26 In José Kentenich

“Depois do 31 de Maio. Uma actualização do pensamento de José Kentenich”

Entrevista a Ignacio Serrano del Pozo, editor do livro “Después del 31 de mayo. Una actualización del pensamiento de José Kentenich”  (Depois do 31 de Maio. Uma actualização do pensamento de José Kentenich) •

Ignacio Serrano del Pozo, Universidade de S. Tomás, Santiago do Chile, membro da União das Famílias, reconhecido e querido autor em schoenstatt.org sobre temas do Padre Kentenich e da sua missão (Três atitudes filiais em relação ao Padre Kentenich, A missão do 31 de maio como resposta ao tempo presente, Encarnação, comunhão multiforme, descentralização na unidade, sinodalidade), acaba de publicar um livro que, uma vez aberto, não se fecha antes de se ter lido todo, e não é uma leitura “leve”.  É um livro que nos faz pensar, requer que se pense e se volte a pensar, e procura fazer-nos compreender um momento chave da história e da espiritualidade de José Kentenich e da sua obra, Schoenstatt: a missão do 31 de Maio, uma tarefa “em que nem o próprio Fundador de Schoenstatt teve muito sucesso”, como diz o autor. —

Tivemos a sorte de poder entrevistar Ignacio Serrano del Pozo sobre este livro, e a sua importância e desafio em tempos do Papa Francisco e mais de 50 anos após a morte de José Kentenich.

Em Outubro de 2019, a Editora Patris do Chile publicou o seu livro Después del 31 de mayo: Una actualización del pensamiento de José Kentenich (Depois do 31 de Maio.  Uma actualização do pensamento de José Kentenich)  Porquê este livro sobre o 31 de Maio agora?

Antes de mais nada, não é o meu livro, do qual sou editor e autor de um artigo. O livro é uma colecção de trabalhos que querem compreender melhor a Missão de 31 de Maio. Esta é uma tarefa árdua, na qual nem mesmo o próprio Fundador de Schoenstatt teve muito sucesso. Ele não era compreendido na Igreja, mas também não era compreendido no interior da sua Família, excepto talvez por alguns poucos discípulos. Move-nos a esperança que, depois de 70 anos, graças à distância dada pelo tempo e dadas as novas condições eclesiais e culturais, o assunto possa ser melhor compreendido.

Este texto surge, assim, no contexto da celebração jubilar, uma ocasião propícia para a reflexão. Mas, em segundo lugar, este trabalho tenta iluminar os problemas do nosso tempo, a questão do feminismo e os processos de resiliência, por exemplo, a partir das categorias Kentenichianas de “pensamento orgânico” e “mentalidade mecanicista“. José Kentenich usou estas noções para dar conta de, como os bacilos do bolchevismo de massa e o racionalismo iluminado, ameaçavam dissolver a vitalidade do cristianismo, convertendo-o numa série de ideias abstractas, de ritos mecânicos e de estruturas vazias.

A pergunta que deveria interpelar-nos hoje é: Quais são os desafios que nos esperam hoje, quais são os nossos “vírus” poderíamos dizer, para ver se estes podem ser melhor diagnosticados ou superados a partir das intuições geniais que estão presentes na missão de 31 de Maio.

Com os anos, a mensagem de José Kentenich parece-lhe ganhar ou perder validade? Porquê uma actualização?

A actualização está de acordo com o mesmo pedido que o Fundador fez aos schoenstatteanos: refundar em cada 50 anos, para que cada geração pudesse re-apropriar-se da sua herança espiritual.

Certamente, o subtítulo de uma “Actualização do Pensamento de José Kentenich” pode ser presunçoso. Kentenich é um profeta que se referiu a questões que requerem séculos para serem decantadas. A actualização está de acordo com o mesmo pedido que o Fundador fez aos schoenstatteanos: refundar em cada 50 anos, para que cada geração pudesse re-apropriar-se da sua herança espiritual. Outra imagem que pode contribuir para a compreensão desta actualização é a utilizada pelo Concílio Vaticano II.

A mensagem do Evangelho exige uma actualização, não no seu conteúdo, mas nas suas acentuações, na sua linguagem ou na sua abordagem ao mundo. Este livro também quer ser uma actualização nessa linha. Os textos de 31 de Maio que existem, e que foram escritos nas últimas décadas, penso no que o Pe. Rafael Fernández publicou em espanhol ou o Pe. Jonathan Niehaus em inglês, estão mais de acordo com o género apologético próprio da pregação. Mesmo muito do que o Fundador de Schoenstatt escreveu para explicar o acontecimento do dia 31 de Maio pertence a este estilo homilético.

Nesta área não há necessidade de problematizar, mas sim de mostrar a profundidade ou implicações de uma questão sobre a qual todos estão mais ou menos de acordo. Os artigos do nosso livro têm uma pretensão académica, que implica analisar e discutir certos pressupostos ou examinar e repensar certas teses, mesmo que estas tenham sido pronunciadas pelo Pai e Fundador. Na verdade, os artigos que dão forma a “Depois de 31 de Maio” poderiam ter sido publicados em prestigiosas revistas académicas de psicologia, sociologia, filosofia ou teologia. Parece-me que esta actualização do estilo de transmissão da mensagem de Schoenstatt é tremendamente necessária e não desprezável.

Se tivéssemos que falar em termos de marketing, essa pretensão académica seria a sua USP (Unique Selling Proposition) ou marca diferenciadora?

Resistimos intencionalmente a falar do “Pai” ou do “Fundador” sem mais, e preferimos dizer o Pe. Kentenich ou o Fundador de Schoenstatt. Esta exigência de ampliar o olhar, de sair dessa posição um tanto “esotérica” que é habitual em Schoenstatt (como em qualquer movimento carismático), é um elemento diferenciador.

Em Janeiro de 2019, fizemos uma ampla convocatória para que diferentes pessoas de diferentes comunidades de Schoenstatt escrevessem sobre o dia 31 de Maio. Os artigos podiam ser enviados em inglês, espanhol ou alemão. Mas esta convocatória exigia que os interessados se ajustassem aos cânones académicos. Isto não significava falar com termos difíceis ou referir-se a questões abstractas, pelo contrário, implicava tentar ser cientificamente objectivo para que muitas pessoas, mesmo fora de Schoenstatt (que não viveram o carisma, estão alheias à sua história interna ou não conhecem a língua) pudessem compreender a mensagem envolvida no marco do 31 de Maio

 

Após uma selecção feita por uma pequena comissão editorial, oito artigos foram aceites. Pode parecer anedótico, mas até nos perguntámos se nos deveríamos referir ao Pai e Fundador como José Kentenich ou melhor ainda, Josef Kentenich. Assim como a opinião pública fala de Josef Ratzinger ou de Karl Marx, e ninguém num trabalho universitário com pretensões de objectividade os chamaria José ou Karl, ainda pensámos apenas em escrever Josef Kentenich, utilizando a sua ortografia original. No final, ele não perseverou nessa opção, mas nós resistimos intencionalmente a falar do “Pai” ou do “Fundador” sem mais, e preferimos dizer o Fundador de Schoenstatt.

Esta exigência de ampliar o olhar, de sair dessa posição um tanto “esotérica” que é habitual em Schoenstatt (como em qualquer movimento carismático), é um elemento diferenciador. Além disso, esta estratégia editorial está, conscientemente, na linha de um “Schoenstatt em saída”. Mas isso não é tudo. A própria utilização de uma ampla convocatória, e que o livro não representasse a visão de uma pessoa ou o projecto de um indivíduo, torna possível outra diferenciação. Este trabalho, como um todo, tem a riqueza de ser constituído a partir de diferentes abordagens.

Embora pareça óbvio dizê-lo, não há intérprete oficial de José Kentenich, sem dúvida houve vozes mais autorizadas (penso no Pe. Alex Menningen ou no Pe. Humberto Anwandter, por exemplo), mas cada pessoa o lê a partir da sua originalidade e de acordo com os sinais do seu tempo, e cada comunidade o recebe a partir das suas preocupações e ideais. Esta “sinodalidade” ou “caminhar juntos” também se reflecte neste livro. É verdade que o trabalho comentado contém um documento oficial, a Carta do Conselho da Presidência Internacional da Obra de Schoenstatt e um léxico de termos, o Dicionário sobre o 31 de Maio; contudo, estes textos pretendem apenas dar um enquadramento geral. O tom é dado pela multiplicidade de propostas escritas com muita liberdade. Assim, alguns artigos preferem tratar do aspecto mais psicológico da categoria de vínculo e outros referem-se mais ao problema histórico levantado pelo conflito de Kentenich com a hierarquia da Igreja alemã.

O livro saiu num ano de grandes desafios e crises, no âmbito eclesial e sócio-político no Chile, mas não só no Chile. De que forma o pensamento do Pe. Kentenich, expresso no 31 de Maio de há 70 anos atrás, é actual para esta época?

Devo admitir que o livro não aborda em nenhum dos seus artigos a crise dentro da Igreja chilena nem a explosão social que começou no Chile no dia 18 de Outubro. Mas parece-me que esta ausência obedece a algo que o próprio livro quer recompor. A minha intuição é que as gerações anteriores à nossa, particularmente os Padres de Schoenstatt, as Irmãs e Irmãos de Maria, assim como alguns leigos, têm privilegiado uma leitura de Kentenich como pai, psicólogo e educador.

Talvez isso se deva ao facto de que aqueles, a quem coube transmitir o Pai-Fundador, tiveram contacto directo com ele, pelo que ficaram muito impressionados com essa faceta de “formador de almas” e com a forma como isso despertou a vida nas suas vidas. A desvantagem desta abordagem (mas que torna o assunto muito interessante) é que ela significou que se desconhecessem outros aspectos da mensagem do Padre Kentenich. Estou a pensar, por exemplo, na sua dimensão como filósofo da história, na sua visão como sociólogo da cultura, bem como na sua teologia do símbolo ainda não desenvolvida, ou na sua Pastoral matrimonial e sexual ainda pouco difundida.

Este livro mostra que uma aproximação a algumas destas dimensões pode ser um alfobre tremendamente produtivo; por exemplo, em “Depois do 31 de Maio” há um trabalho que trata do pensamento histórico do Pai Fundador, e outro o fenómeno da secularização com vista a pôr dialogar Kentenich com Max Weber e Friedrich Nietzsche.

O que espera que este livro desperte nos seus leitores?

Adoraria que o livro pudesse ser discutido. Parece-me que a exposição à crítica é fundamental para trazer ar fresco para o mundo intelectual de Schoenstatt. Não há nada pior do que a indiferença.

Devo dizer que me conformo que o comprem e o leiam, nestes tempos já é bastante. Quando esta primeira etapa estiver concluída, gostaria que o livro pudesse ser discutido. Parece-me que a exposição à crítica é fundamental para trazer ar fresco para o mundo intelectual de Schoenstatt. Não há nada pior do que a indiferença. Numa terceira etapa, para a chamar de alguma maneira, eu gostaria muito que este trabalho pudesse gerar propostas semelhantes.

Estou convencido de que, se continuarmos a repetir as mesmas categorias habituais, em breve acreditaremos que Kentenich não é uma resposta e acabaremos por ir ter com o profeta do momento. Nesta linha, sonho com outros estudos que abordem problemáticas ou desafios actuais para responder a partir de Schoenstatt: penso, por exemplo, na questão ecológica a partir do pensamento orgânico ou na sinodalidade eclesial e no princípio da descentralização, a partir das leis de governo Kentenichianas, para citar dois temas que estão presentes no pontificado do Papa Francisco.

A própria Teologia da Graça avançou muito desde o período pré-conciliar, mas não a incorporámos ao nosso entendimento do “Capital de Graças”. Também a “questão social” e o papel dos leigos é uma exigência a ser estudada. O que então devemos esperar deste livro “Depois de 31 de Maio“? Mais do que novas edições, espero que inspire outros projectos editoriais similares.

 

ISBN: 978-956-246-918-0

Editora Nueva Patris, Chile

Ano de publicação: 2019

 

Para comprar no Chile:

Nas livrarias do Movimento ou através de Nueva Patris Chile

Fora do Chile

O livro só pode ser comprado nas livrarias do Movimento em Espanha, Estados Unidos, Costa Rica, Equador, Paraguai, Peru e Argentina. Possivelmente em 2020 sairá como um E-Book, o que facilitará a compra.

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Original: espanhol (24/1/2020). Tradução: Lena Castro Valente, Lisboa, Portugal

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