Posted On 2015-03-17 In Francisco - iniciativos e gestos

Pedro, chamado Francisco

José Luis Restán/PaginasDigital.es Nestes dias, próximos da data do segundo aniversário da eleição de Jorge Bergoglio como Papa Francisco, eu me sentia um pouco cansado e perdido em meio à tantas análises que pretendem fechar um suposto programa reformador pré-concebido e, por outro lado, com não poucas suspeitas e irritações que já quase se cristalizaram em uma espécie de resistência passiva. Com certeza, no meio está o bom povo de Deus, que sempre entendeu e sentiu uma familiaridade imediata com o Sucessor de Pedro, seja qual for a fisionomia dele. Oscilava entre esses pensamentos quando tive a oportunidade de ler o belíssimo texto do Pe. Mauro Lepori Abade Geral da Ordem Cisterciense [ordem monástica] que consta em seu livro Simão chamado Pedro”.

No fundo, disse o Abade Lepori, “o que nos deve incentivar a olhar, escutar e seguir o Papa está essencialmente no mistério de amor entre Cristo e Pedro, que Jesus instituiu como a realidade que nos apascenta, nos pastoreia e nos guia no caminho da vida”. A seguir, expressa com grande agudeza algo que frequentemente me ronda, quando leio algo de muitos colegas ou escuto de alguns responsáveis eclesiais: “Se perdemos isso de vista, o Papa se torna apenas uma autoridade pública como outras e tudo dependerá do que ele fale ou não fale, do que faça ou não faça, do que pense ou não pense. Ou, principalmente, de tudo o que nós pensamos que disse ou não disse, que fez ou não fez, que pensou ou não pensou…”

O Abade cisterciense explora o significado profundo do mistério de Pedro, o rude e valente pescador cujos limites sempre aparecem à flor da pele; aquele que, entretanto, Jesus escolhe para ser cabeça de sua Igreja “em saída”. Poderíamos dizer que o escolhe contra o vento e a maré, contra toda prudência e cálculo humano. E, com essa escolha, dá forma a uma relação que permanece como pedra forte, como sustentáculo firme e indefectível ao longo da história da Igreja. Pe. Mauro navega pelo significado da relação de Pedro com Jesus, valendo-se para isso do olhar de São João, o discípulo amado, oferecendo assim um fascinante contraponto.

Ele nos explica que João está presente no livro “como com o olhar voltado para Pedro…”, como aquele que obedeceu a última e fundamental indicação de Cristo para viver o seguimento dos discípulos prediletos: seguir com Pedro, continuar seguindo Pedro que caminha com Jesus, que fala com Jesus, que ama Jesus. Fixa-se, por exemplo, na cena em que ambos os apóstolos correm até o sepulcro vazio; João, que é jovem, chega primeiro, mas sabemos que não entrou até que Pedro entrasse antes dele. Poderia ter entrado, comenta Dom Mauro, e seria compreensível, por causa da emoção e do sentimento; contudo, não entrou. Na figura de João estão representados os melhores, os mais disponíveis para a missão, os mais puros no seguimento de Jesus. Porém, João “não se deixa determinar pelo fato de que, sob muitos aspectos, ele é superior a Pedro; compreende e ama a Cristo mais que Pedro, porque João não o negou, estava ao pé da cruz, ele viu Jesus morrer, viu como foi traspassado”. É curioso; João sempre chegava antes e mais que Pedro, mas, no final do Evangelho, o vemos seguindo (a uma discreta distância) Jesus, que caminha com Pedro. E é então que (e assim será sempre) “Pedro caminha guiado diretamente por Jesus, junto com Jesus vê o caminho e o sentido; tudo o que sabe, disse e dirá, busca diretamente do Ressuscitado que lhe fala”.

O Abade geral cisterciense disse que esse é o mistério petrino que orienta a Igreja há 2.000 anos. E recorre assombrado os diversos temperamentos e matizes de humanidade naqueles que têm transmitido o mistério petrino ao longo dos séculos de história da Igreja. “Dá a impressão de que o Espírito Santo se diverte saltando de um extremo a outro, de um Pio XII a um João XXIII, de um Bento XVI a um Francisco. Que contrastes! Porém, em minha opinião, ele faz isso apenas para nos ajudar a nos fixarmos no essencial, que era o essencial também no primeiro, com Pedro: a objetividade de poder seguir alguém a quem Cristo garante seu apego, de modo que seguindo esse homem possamos estar seguros de que estamos seguindo o Ressuscitado”.

D. Lepori lança uma pergunta fundamental: “O que nos fascinou e incentivou nos últimos Papas?”. Pode ser sua doutrina, suas iniciativas, sua caridade pastoral, talvez suas decisões de governo… Ou talvez tenhamos estranhado alguma dessas coisas, que inclusive desgostaram a uns ou a outros, conforme os casos. Porém, no fundo, a única fascinação que vale, que permanece, que nos ajuda a viver, “é sua relação com o Senhor, seu ‘Sim, te amo’, dito Àquele a quem queremos amar, Àquele que caminha no meio de nós e nós queremos seguir”.

O Papa é autoridade exatamente em virtude dessa relação de amor que foi selada na conversão com o Ressuscitado às margens do lago. “Talvez não consigamos entender o que Pedro fiz ou faz, como não sabemos, naquela manhã, se João ouvia o que Jesus e Pedro conversavam; porém, sabemos com certeza que Cristo e Pedro amam-se mutuamente por todos nós; que eles são amigos, um gosta do outro, caminham unidos, para nos indicar o caminho seguro da verdadeira vida”.

Há apenas uma semana, pude ver cara-a-cara e escutar Francisco na Praça de São Pedro; fez seu próprio relato daquele diálogo de Jesus com Pedro depois da ressurreição. “Que em si não era o resultado de uma força de vontade, não vinha apenas da decisão do homem Pedro: vinha, antes de tudo, da Graça, era aquele “antecipar”, aquele preceder da Graça… Somente aquele que se sentiu acariciado pela ternura da misericórdia conhece verdadeiramente o Senhor. O lugar privilegiado do encontro é a carícia da misericórdia de Jesus Cristo em meu pecado. É por isso que, algumas vezes, vocês têm me escutado dizer que o lugar, o lugar privilegiado do encontro com Jesus Cristo é o meu pecado”.

É verdade que o Pedro, que naquela manhã seguia Jesus, e que João seguiu, não era o Pedro humanamente perfeito; podemos fazer uma lista dos episódios de vacilação, preguiça, e inclusive de certa covardia, que o relato dos Atos não quis apagar. Porém, como disse o Pe. Mauro Lepori, “também esse Pedro vive, como sempre, dentro do caminho da certeza de sua relação com Cristo; e Jesus nunca tirará dele o carisma de caminhar à frente de todos os discípulos na comunhão da verdade e do amor com o Ressuscitado”. Por isso, entendo mais e melhor as últimas palavras que escutei Francisco dizer, sábado passado, e que são muito mais do que um bordão: “por favor, não se esqueçam de rezar por mim”.

De coração, Santo Padre.

Fonte: Paginas Digital.es
Com permissão dos editores, a quem agradecemos.

O autor é um jornalista muito conhecido da comunidade Comunhão e Libertação (CL)


Original em espanhol. Tradução: Maria Rita Fanelli Vianna – São Paulo / Brasil

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