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Posted On 2022-07-16 In Artigos de Opinião, Dilexit ecclesiam

De nós, Schoenstatt, o que precisa a Igreja?

Guillermo Parra, Chile •

Recebi uma cópia desta carta do Guillermo Parra na qual ele responde a um irmão na Aliança sobre o “4º marco” – é o que chamam nos círculos interiores de Schoenstatt aos acontecimentos de 1965, com o regresso do Pe. Kentenich a Roma e Schoenstatt após o seu “exílio” em Milwaukee, o seu encontro com Paulo VI e a promessa de assumir a missão pós-conciliar da Igreja e contribuir para a sua realização – e a sua projecção no futuro. “Achei muito interessante e perguntei-lhe se poderia ser publicado no schoenstatt.org e ele disse-me que teria todo o gosto nisso. Parece-me ser uma contribuição”, escreve José María Fuentes, da União dos Homens do Chile. —

Caro irmão, não posso deixar de ficar impressionado com a tua persistência em tratar de mover e destacar aquilo que não parece preocupar os níveis dirigentes de Schoenstatt, muito menos os seus membros comuns:

  • O 4º Marco (o regresso do Pe. Kentenich a Roma e Schoenstatt no contexto do Concílio Vaticano II).
  • a Confederação Apostólica Universal (ideia e objectivo de São Vicente Pallotti e dos Palotinos, retomado pelo Pe. Kentenich em 1916 como parte do objectivo de Schoenstatt)
  • inserção na Igreja (embora Schoenstatt faça naturalmente parte da Igreja, é Igreja, portanto trata-se mais do serviço de Schoenstatt na Igreja e da Igreja)
  • O compromisso do Padre Kentenich com Paulo VI de contribuir activa e conscientemente para a realização da missão pós-conciliar da Igreja em todas as suas áreas: liturgia (SS), Igreja peregrina e como povo de Deus, justiça e paz, comunicação, sociedade, Pastoral, ecumenismo, liberdade religiosa, etc., expresso nas suas constituições e declarações como Lumen Gentium, Sacrosanctum Concilium, Gaudium et Spes, Dignitas Humanae, Intermirifica, etc.).

Estes são temas que já partilhámos mais de uma vez, mas sem dúvida que todos temos estado preocupados, e por vezes ocupados, com a situação interna de Schoenstatt e a sua interacção com o mundo social e eclesial actual, temas que temos visto como factos históricos, distantes e afastados da realidade palpitante da vida e dos problemas actuais de Schoenstatt e da Igreja….

…contudo, penso que a tua insistência deve ter algum significado, e isso leva-me a pensar que há algo importante neste assunto da relação Schoenstatt – Igreja que não deve ser deixado de lado, mas, pelo contrário, que devemos prestar-lhe atenção.

Actualização do tema do serviço de Schoenstatt na Igreja

Para o fazer, na minha modesta maneira de pensar, em primeiro lugar temos de remover o preconceito da sua tendência histórica e transformá-lo num problema actual, ou seja, actualizá-lo, trazê-lo para o presente, fazê-lo convergir com a realidade actual do mundo e da Igreja e com as possibilidades reais de Schoenstatt de dar uma contribuição apostólica “à Igreja” para a ajudar, como disse o Fundador, a ser o que mais precisa de ser hoje: a alma de um mundo renovado, de um novo espírito e de uma nova ordem de vida pessoal e social a partir dos valores evangélicos. Fazer uma “revolução do espírito” que transforma de “dentro” as relações pessoais e sociais dos nossos povos.

Creio que esta é, na sua essência, a tua grande preocupação e que plenamente partilhamos, porque é uma missão de grande relevância e necessidade. Hoje mais do que nunca.

De uma perspectiva apostólica o que precisa hoje a Igreja, para esta missão e à qual Schoenstatt poderia dar uma grande contribuição?

Parece-me que na nossa Igreja (e em Schoenstatt) temos claramente duas visões da realidade actual: Um olhar “de cima”, do eclesial, especialmente hoje com o magistério iluminado do Papa Francisco, e do qual tudo parece bom, claro e luminoso; e um olhar “de baixo” dos leigos, do calor da própria vida e da cultura que hoje determina o ser e agir das pessoas, do qual vemos que esta luminosidade não parece ser esclarecedora, e o que é pior, muito poucos a vêem como congruente e, portanto, necessária nas suas vidas. É evidente que existe, para além da nossa vontade, uma evidente desconexão entre as duas visões, o que impede a sua inter-relação mutuamente frutuosa para iluminar a modernidade em que nos encontramos.

A questão que então nos podemos colocar é como podemos nós, de Schoenstatt, abordar este desafio vital na realidade actual? Creio que, se nos interrogarmos, como tu o fazes, sobre a possibilidade de uma eventual Confederação Apostólica Universal (CAU), não parece ser um bom ponto de partida neste momento. Pelo contrário, parece-me que as perguntas iniciais poderiam ser:

De uma perspectiva apostólica, em que é que a Igreja, no mundo de hoje, é fraca e tem grandes dificuldades para se inserir numa renovação evangelizadora da nossa cultura moderna interior e exterior, à qual tem sérias dificuldades de acesso?

Se aceitarmos o acima exposto: Schoenstatt tem uma missão muito especial neste sentido, tanto dentro como fora da Igreja, exigida pelo seu Fundador?

(O que tu defendes, caro irmão, é algo que subscrevo: que este desafio apostólico intra-eclesial não é opcional para Schoenstatt: é intrínseco à sua missão e está formalmente comprometido pelo Fundador perante a Igreja. Isso é algo de que não nos lembramos muitas vezes).

Se dissermos sim ao acima exposto: O que poderia – ou deveria – Schoenstatt ser capaz de oferecer hoje à Igreja, a partir do seu próprio carisma e realidade, nessa direcção?

Se pudéssemos fazer um processo dedutivo com os elementos que mencionámos, que a grande batalha da Igreja hoje é ser capaz de se inserir e iluminar – com a sua luz evangélica – a realidade da vida e da cultura actual e que tem sérias dificuldades em enfrentá-la, e que por outro lado este desafio é próprio de Schoenstatt: batalhar por uma nova cultura religioso-moral-social no nosso tempo e no tempo futuro, exactamente o que a Igreja precisa, talvez pudéssemos tentar responder a estas questões de uma forma que não seja retórica mas prática, possível e vivível. E então, creio, estaremos a aproximar-nos, tornando presente – e possível – o esquecido “4º Marco ” que é a tua grande preocupação e que eu partilho.

Espaços para a intercepção do Evangelho com o mundo de hoje

Onde está o cerne do problema? Temos algumas pistas entre todas as coisas sobre as quais conversámos nestes tempos pandémicos e turbulentos dentro da Igreja e de Schoenstatt. Por exemplo, se olharmos para o mundo “real”, não podemos deixar de ver que o problema central da Igreja (para além da questão do abuso) é a sua percepção de “alienação”, sendo estranha, distante das necessidades e realidades das pessoas que hoje habitam o mundo. E vimos que como Igreja (leiga e consagrada) precisamos de compreender mais e melhor o mundo social e cultural que é vivido e desenvolvido à nossa volta, de encontrar nele a voz e a vontade de Deus que guia a história, e de agir em conformidade. Mas o grande problema parece ser a dificuldade de encontrar espaços de intercepção frutuosa entre a iluminação evangélica e as ideias e realidades da vida actual, que dão origem a um novo espírito na nossa maneira de ser e de nos relacionarmos uns com os outros como pessoas e sociedade. E daí a semente (profética) de uma Nova Ordem Social, que é outra forma de dizer o Reino de Deus nesta terra, uma missão eclesial – laical que é o mandato do Vaticano II, o magistério central do Papa Francisco e a missão específica de Schoenstatt.

Perante isto, podemos perguntarmo-nos, que espaços tem a Igreja, a Igreja chilena para não ir mais longe, para interceptar a realidade da vida e da cultura actual e fazer dela a experiência vital de abertura a uma compreensão mais profunda, real e integral das pessoas na sua vida e na sua luta neste mundo: as paróquias? Penso que dificilmente se concentram no sacramental e na proclamação da Palavra, o episcopado? parece-me que ainda mantém a sua imagem como um “palácio” distante e inacessível, a Conferência Episcopal? Distantes e abstractas, as escolas católicas? um grande espaço, mas tenho sérias dúvidas sobre a sua capacidade de mudança cultural, as universidades católicas? talvez, mas para uma elite intelectual e a sua influência parece não chegar à vida quotidiana do “povo de Deus”. 

Pode Schoenstatt oferecer “espaços vinculantes” à Igreja?

E face a esta realidade, o que tem precisamente Schoenstatt para oferecer à Igreja nesta tarefa missionária crucial de intercepção do Evangelho e do mundo, da fé e da vida real? Schoenstatt tem algo importante para esta tarefa apostólica: tem um “espaço” para isso, um “espaço exterior” (os Santuários e o seu entorno) e um “espaço interior” (as suas graças especiais, as suas comunidades, a sua pedagogia e as suas ideias). Um grande “espaço”, espalhado pelo mundo como um dom de Deus para uma missão histórica, e que, muitos de nós pensamos, não deve ser reduzido, como é hoje, à esfera da comunidade espiritual pessoal – pedagógica e familiar. Tudo bem, mas como o Fundador disse uma vez, é apenas a primeira parte do programa da Fundação. Porque se olharmos para as suas pregações pré e, especialmente, pós-Milwaukee, a sua visão foi para além disso…

Talvez seja tempo de nos perguntarmos se nós, como Schoenstatt, não podemos fazer algo mais, se não é tempo de entrarmos plenamente nesta “batalha” eclesial, se fizéssemos oficialmente uma “Aliança de Amor e Serviço” com a sua cabeça. E, como gesto concreto deste espírito, o que aconteceria se o Movimento Apostólico de Schoenstatt, a nível global, colocasse conscientemente e oferecesse os seus “espaços”, como objectivo missionário assumido oficialmente, ao serviço da Igreja institucional, assumindo assim oficialmente o “Quarto Marco”? Por exemplo, convidar e unir as organizações apostólicas dos vários organismos eclesiais e Movimentos Apostólicos para enfrentarem juntos este desafio apostólico.

Não sabemos o que aconteceria, que resultante criadora poderia emergir, ou não emergir, mas poderíamos saber que estamos a dar, apostolicamente, o melhor de nós próprios, oferecendo-nos conscientemente, e com a nossa comum orientação apostólica, o nosso carisma e a nossa comunidade, como semente (cada um na sua realidade e todos juntos) de um novo espírito social de uma nova cultura evangelizada. Seria abrir um espaço de reflexão apostólica em comum com o mundo eclesial e laico que gera um espírito de unidade a partir do Evangelho para compreender melhor, mais ampla e profundamente, a cultura actual e assim visualizar orientações e estratégias apostólicas conjuntas que nos permitam ter um maior grau de significado intra-eclesial e impacto extra-eclesial. Pode também ser a nossa resposta ao espírito sinodal que Francisco quer dar à Igreja nestes tempos. Ou será pedir demasiado?

Algo sobre o que falar.

Fraternalmente,

Guillermo Parra S.

Colaboração: José María Fuentes


Foto: Plouha, França. Capela de Kermaria-an-Iskuit , Joaquin Ossorio-Castillo, iStock Getty Images

 

Original: espanhol (12/7/2022). Tradução: Lena Castro Valente, Lisboa, Portugal

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