Columna P. Enrique Grez López

Posted On 2021-10-17 In Artigos de Opinião, Coluna - P. Enrique Grez López

Madres Paralelas: Os itinerários da vida

Pe. Enrique Grez •

Mais uma vez, Almodóvar tem muito a dizer. A história flui rapidamente, dando-nos informação à justa para seguirmos o fio condutor deste romance fílmico sobre memória, maternidade e sacrifício. —

Grez

Fotograma do filme tirado do imdb.com

Yanis é uma mulher madura, profissional e fresca, determinada a não esquecer aqueles que a trouxeram ao mundo. Está obcecada em encontrar a sepultura do avô, que morreu na Guerra Civil. Ana, por outro lado, é uma jovem rapariga. De facto, ela é menor de idade. A sua história é curta, assim como os afectos da sua família. Ana tem a vida à sua frente e lembra-se de muito pouco, quase nada. Em vez disso, ela quer esquecer.

Encontram-se na sala de partos. Não podiam ser mais diferentes, são duas atitudes vitais: uma sorridente e natural, a outra assustada de morte. A história é tecida até estarmos numa encruzilhada: Yanis e Ana avançam e recuam no tempo ao mesmo tempo, lembram-se e projectam-se, vão sentindo muitas coisas.

É difícil para mim declarar o que gosto no filme sem esventrar a sua história, sem contar alguns detalhes que, colocados na mente do leitor, iriam quebrar o encanto da história. E isso seria um pecado. Aqui reside a grandeza do filme. É uma obra que se baseia fortemente no seu guião cheio de reviravoltas inesperadas. Madres Paralelas é um romance algo barroco, narrado com imagens, movimentos e diálogo; um romance que se constrói em torno de personagens contraditórias e cativantes. Por exemplo, temos Elena (Rossy de Palma), amiga de Yanis.

Impossível não recordar alguns dos episódios mais importantes do Antigo Testamento

Este é o trabalho de um Almodóvar maduro que brilha com todo o seu estilo. A decoração de apartamentos e quartos tornou-se mais simples, mas não menos intensa. Destaco a utilização de cores lisas e intensas. Existem os tons favoritos do realizador: carmim, verde-água e amarelo pálido, que ocupam os fundos das cenas e dão um contexto de pureza muito apropriado aos seus retratos. O sentido de cor do realizador é requintado, e só isto faz que valha a pena ir ao cinema para o ver.

No filme há muitos dos arquétipos do autor que também encontramos noutros filmes: as pessoas, o suspense, as histórias de família, o estranho, o acampamento e, sobretudo, as mulheres. Representam um certo pico de humanidade no qual não falta força e sabedoria. As Madres Paralelas têm tudo isso e muito mais: uma grande admiração pela capacidade das mulheres de ampliarem os seus corações. É um trabalho cheio de nuances, com personagens que atravessam, amadurecem e fazem processos. Os temas que percorrem o guião representam algumas questões bíblicas, tais como o respeito pelos pais, o sacrifício e a reconciliação. É impossível, até certo ponto, não recordar episódios importantes do Antigo Testamento, como o de Hannah ou o próprio julgamento de Salomão.

Penso que a questão que atravessa o filme é a relação das mulheres com a vida. A vida dos pais e antepassados é resolvida na elaboração da memória, mas também a relação com a própria vida, os próprios itinerários, o crescimento e as relações com o parceiro. Não menos importante, há uma descrição da relação com a vida que é engendrada, que é bem-vinda e a que se diz adeus, que é abraçada e acompanhada com uma importante quota de renúncia e ternura.

 

Ficha Técnica

DIRECTOR: Pedro Almodóvar
ANO: 2021
TÍTULO: Madres Paralelas (Parallel Mothers)
PAÍS: Espanha
ELENCO: Penélope Cruz, Milena Smit, Israel Elejalde, Rossy de Palma, Aitana Sánchez-Gijón
GÉNERO: Drama
GALARDONES: Nomeada para o Leão de Ouro de Veneza para melhor filme
PLATAFORMAS: Cinemas

 

 

 


AVISO: O autor desta coluna não classifica os filmes de acordo com uma avaliação moral do seu conteúdo. Também não sugere idades mínimas de visualização. Em geral, estes são filmes para adultos. Sugere-se a verificação dos critérios de orientação disponíveis nas plataformas.

Original: Espanhol (15/10/2021). Tradução: Lena Castro Valente, Lisboa, Portugal

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