Pe. Elmar Busse •
Se olharmos para a aplicação de Santuários ou para um mapa do mundo que mostra mais de 200 Santuários de Schoenstatt, é óbvio: Schoenstatt é um Movimento de renovação católica mundial com uma dinâmica particularmente intensa na América Latina. Mas como é que tudo começou? Em retrospectiva, a palestra do Padre Kentenich de 18 de Outubro de 1914 na capela do cemitério, recentemente renovada no recinto pallotino de Vallendar-Schoenstatt, é considerada como o nascimento do Movimento de Schoenstatt. Era a semente nascente de uma nova espiritualidade, completada pelos escritos do Fundador contrabandeados ilegalmente do Campo de Concentração de Dachau, e um ousado sonho de um lugar sagrado, que não começou por milagres de graça extraordinária. Mas o dia 18 de Outubro de 1914 foi um processo puramente interno num centro de formação pallotino. Como se espalhou?
No tumulto e nas dificuldades da Primeira Guerra Mundial, alguns soldados perceberam que os seus companheiros de Schoenstatt eram, de alguma forma, mais capazes de lidar com as dificuldades. Quando lhes foi pedido, partilharam entusiasticamente o seu sonho de transformar a pequena capela num lugar de peregrinação internacional para a Mãe de Deus.
E o caminho para que o Céu reagisse positivamente aos seus pedidos eram as “contribuições para o Capital de Graças”. Se todas as dificuldades, todo o peso, toda a loucura da vida quotidiana do soldado fossem sacrificados, e assim se desse sentido a uma situação que em si mesma não tinha sentido e causava sofrimento, então poder-se-ia “fazer com ela uma suave violência” ao Céu.
Então, a intuição fiel do Pai Espiritual de que o Céu quereria algo assim deles poderia tornar-se numa nova e surpreendente realidade. Mais uma vez o poder electrizante e motivador das utopias foi demonstrado.
A revista MTA [Mater Ter Admirabilis], concebida como uma revista de comunicação em rede, conseguiu manter vivo o entusiasmo, apesar das circunstâncias mais adversas, com o subtítulo “Sugestões mútuas na luta pelos nossos ideais ameaçados em tempos difíceis”.
A guerra chegou ao fim – e agora?
Quando a guerra terminou, os entusiastas de Schoenstatt que não eram estudantes dos Pallottinos ou que não queriam chegar a sê-lo, perguntavam-se como continuar.
Schoenstatt estava localizado na zona francesa da ocupação aliada da Renânia, que durou de 1918 a 1930. Foi difícil chegar a Schoenstatt de outras partes da Alemanha.
Alois Zeppenfeld, de Dortmund-Hoerde, foi o representante mais dinâmico da chamada “organização externa”. Na sua cidade natal, organizou o encontro para os interessados. No final, chegaram 24, 16 schoenstatteanos e outras 8 pessoas. Alois tinha organizado alojamento gratuito em casas de família para todos eles.
O Pe. Kentenich cancelou a sua participação no último momento com um telegrama que enviou a Alois Hoffmann.
No dia 20 de Agosto houve uma grande discussão: O que queremos realmente fundar? Uma aliança de total abstinência? Um partido político católico? Uma organização sócio-caritativa? Todas as propostas estavam em cima da mesa e tinham os seus apoiantes apaixonados. Finalmente, prevaleceram os representantes tradicionalistas: a chamada organização externa da Congregação Mariana de Schoenstatt cresceu através da ênfase na auto-educação e na auto-santificação. Isto deu aos membros – de acordo com a terminologia actual – a desejada resiliência diante das adversidades e traumas da guerra. Eles queriam continuar no mesmo espírito através destas experiências positivas. Assim nasceu a “União Apostólica” com o objectivo: “A finalidade da União é a formação de apóstolos leigos no espírito da Igreja”.
O Padre Kentenich pediu a Alois Zeppenfeld que viesse a Schoenstatt logo após o encontro de Hoerde. Naquela reunião foi realizado o esboço final dos Estatutos da União Apostólica, tal como os conhecemos hoje.
Numa carta de 6 de Novembro, o Padre Kentenich escreveu aos líderes dos grupos da “União Apostólica” fundada em Hoerde:
Todo o Movimento é o seu trabalho e deve permanecer assim. Tudo o que posso e farei é dar conselhos e apoio. É por isso que tenho estado em segundo plano até agora, nem sequer fui ao Dia do Soldado em Hoerde. Se eles estivessem tão impregnados de um sentido de responsabilidade pelo seu grupo como os líderes da nossa Congregacio Militaris estavam, então eu poderia participar mais no trabalho sem medo de paralisar a sua independência e sentido de responsabilidade. Espero que o momento chegue em breve.[1]
O Padre Kentenich estava adoentado na época. Em Schoenstatt, estavam a ser ministrados cursos de retiro para estudantes dos graus superiores. A afluência era muito maior do que o esperado, pelo que mais cursos tiveram que ser oferecidos, tendo sido ministrados pelos Padres Lucas e Laqua. Teria sido desconcertante para estes Padres se o Padre Kentenich, por estar demasiado doente e incapaz para dar palestras de retiro, mas suficientemente capaz para ir a Hoerde. Por esta razão, o Padre Kentenich enviou o estudante Alfons Hoffmann a Hoerde como seu representante.
[1] Carta do Padre Kentenich aos chefes da “União Apostólica” de 6 de Novembro de 1919, revista MTA.
Um começo muito simples
Quando se investiga a história da fundação do Movimento de Schoenstatt, pode-se compará-la com a exploração das nascentes do Nilo, com seus 6.650 km de extensão, o rio mais longo do mundo.
Em 1858, o britânico John Hanning Speke descobriu o Lago Vitória e aproximou-se da nascente. Mas a sua descoberta foi posta em causa em Inglaterra. Portanto, outros pesquisadores de renome viajaram, novamente, para a zona. Em 1875, foi Sir Morton Stanley quem percebeu que o Lago Vitória tinha afluentes do sul, cujas nascentes estavam nas montanhas Ruwenzori de 5.000 metros de altura, no actual Ruanda e no Burundi. Estas são consideradas, ainda hoje, como as nascentes do Nilo.
Este pequeno riacho, depois de milhares de quilómetros, um rio poderoso! 24 alunos e estudantes em Dortmund-Hoerde 1919: vários milhões de schoenstatteanos e simpatizantes 100 anos depois! O número é difícil de determinar porque é típico de um Movimento que os limites sejam fluidos. Só as comunidades de Schoenstatt, que têm um maior grau de compromisso, têm números mais precisos.
O Pe. Kentenich tinha apontado repetidamente que, em vista da insignificância dos instrumentos (aplicado à sua pessoa com a sua frágil saúde) e da magnitude das dificuldades, a magnitude do sucesso só podia ser explicada pela graça – ele falou da ” resultante criadora”.
Por último, gostaria de citar a canção do cantor e compositor cristão da antiga República Democrática Alemã, Gerhard Schöne:
Refrão:
Tudo tem de começar devagar.
Deixa o tempo passar,
só tem que ganhar força
e finalmente torna-se numa coisa grande.
Primeiro que tudo, olha para este grão,
É difícil de ver,
torna-se uma folha de erva,
mais tarde vai ser uma árvore.
E depois de muitos anos,
quando me reformar,
vai dar-me sombra,
e o melro vai cantar nele.
Olha para a nascente fina.
entre musgo e pedra,
acumula-se no vale
para ser um riacho.
Vai inchar até ao rio,
flui em direcção ao Mar Báltico.
Lá,é um verdadeiro rugido
o peixinho que está nele, canta.
Olha o floco leve.
como ele dança e voa para um galho,
que se dobra debaixo da neve.
O floco aterra lá
e pelo peso
o ramo está quebrado
e o corvo fala.
Às vezes penso tristemente:
“Sou muito pequeno.
Não posso fazer nada quanto a isso.
E depois lembro-me:
Primeiro, começa,
Já o fiz,
para não me desencorajar,
então o poder também cresce.
E depois vejo com espanto:
Não estou sozinho.
Desejo-vos, caros leitores, que ao contemplarem a história fundacional de Schoenstatt, se surpreendam do espanto à gratidão, da gratidão ao louvor a Deus, que sempre nos surpreende quando encontra pessoas abertas aos Seus planos de salvação.
Pe. Elmar Busse
Original: alemão (5/8/2019). Tradução: Lena Castro Valente, Lisboa, Portugal