Posted On 2015-06-30 In Projetos

Papá SOS é o meu herói

PARAGUAI, Dequeni, por Clara Paez, na revista “Ejempla” •

Esta é a história de um pai que evitou que dois filhos caíssem no trabalho infantil. Um exemplo de paternidade responsável para celebrarmos este Dia do Pai.

Ao princípio eram uma família feliz

Dionisio Valdez terminou o 4º ano do Ensino Básico e decidiu deixar a escola para começar a trabalhar. Foi, como muitos outros, “abuela memby” (filho da avó), embora conheça os pais, a relação com eles nunca foi muito estreita e, menos ainda, com o pai. “Eu não soube o que é o amor paterno”, disse ao começar o relato da sua história de vida.

Quando trabalhava numa distribuidora de lacticínios conheceu-a. Com o tempo apaixonaram-se e decidiram entabular a relação que durou 7 anos. Tudo corria bem, ele começou a pagar uma casa, tinha um salário seguro e, o suficiente para que, nunca faltasse nada em casa. Quando chegaram os filhos ela dedicou-se a seu cuidado e deixou de trabalhar. Dois rapazes que, hoje, têm 11 e 9 anos e, uma menina de 7 anos, chegaram para completarem a família.

Mas, os problemas económicos não tardaram a chegar. Ele caiu na armadilha do mau uso do cartão de crédito, as dívidas foram-se acumulando e, já não podia pagar a prestação da casa. Começaram a passar necessidades às quais se juntaram os conflitos de casal. Já não houve remédio, a relação estava rota, então, decidiram separar-se. No princípio, as crianças foram viver com a mãe, estiveram com ela uns sete meses. Ele vivia perto e, ia visitá-los todos os fins-de-semana, até que, se deu conta que, os filhos não estavam a ser bem cuidados. “Disseram-me que andavam na rua, que estavam prestes a denunciar-nos à Codeni e, que, se isso fosse para a frente, tirar-nos-iam as crianças”, conta.

Hora de se encarregar deles

Mal confirmou esta situação decidiu assumir a sua responsabilidade e encarregar-se dos três, apesar de, não ter um trabalho seguro, nem uma casa em boas condições. Um dia foi ter com a mãe e disse-lhe: “Vejo que queres trabalhar e não podes porque tens que tratar das crianças. Deixa que vivam comigo, vou cuidá-los. A minha família vai ajudar-me”.

Chorei muito. Durante o primeiro mês que estiveram comigo, eu chegava do trabalho e, encontrava-os sujos, a dormir sem se lavarem, já não podia trabalhar”.

– Dionisio Valdez

E, aí começou a luta para salvar os meus filhos da rua. Foi muito mais difícil porque não encontrou a ajuda que esperava. “Chorei muito. Durante o primeiro mês que estiveram comigo, eu chegava do trabalho e, encontrava-os sujos, a dormir sem se lavarem, já não podia trabalhar”, recorda. Viviam numa casa onde só tinham electricidade. Ocasiões havia em que os filhos não tinham água corrente para tomar banho. Comida não lhes faltava, porque pagava à sua mãe, a avó, para que lhes cozinhasse todos os dias.

Como só tinham uma cama, as três crianças dormiam juntos, apenas tapados com umas mantas, enquanto Dionisio se ajeitava no chão com os poucos agasalhos que tinha. Só para que tenhamos consciência do importantes que são as campanhas de doação de agasalhos.

Extremamente magro e, com muito mau aspecto estava o Dionisio quando conversou com uma vizinha que lhe falou da Dequeni. Tinha vizinhos cujos filhos iam todos os dias à Fundação e, desse modo, os pais podiam ir trabalhar tranquilos. Então, essa foi a esperança de os seus filhos não deixarem de estudar, porque esse era o seu principal objectivo, que não abandonassem a escola.

O começo de uma vida nova

Foi com os filhos à Dequeni. Ao chegar falou com o porteiro, contou-lhe o seu caso e, este indicou-lhe quem era o responsável do Programa de Protecção da Infância em Risco de Trabalho Infantil.

Ángel Jara, a pessoa indicada para atender o seu caso, estava à porta à espera que todos os miúdos chegassem quando Dionisio se a aproximou para lhe falar. Nesse momento não tinham vaga para receber os seus filhos, mas, em breve, duas crianças completariam a idade para passarem para outro programa e, essa, seria a oportunidade para os Valdez. Só os rapazes iam frequentar a Fundação, porque a menina estava a ser bem cuidada pela madrinha que, até ao momento a levava à escola onde passava todo o dia.

A espera foi de, aproximadamente, 15 dias. Durante esse tempo chamavam o Dionisio e, davam-lhe algumas instruções que fazem parte do processo de admissão. “Chamaram-me numa sexta-feira para me dizer que os meus filhos começariam na segunda-feira. Era como uma vida nova para mim, podia voltar a trabalhar descansado”, diz.

Chamaram-me numa sexta-feira para me dizer que os meus filhos começariam na segunda-feira. Era como uma vida nova para mim, podia voltar a trabalhar descansado

– Dionisio Valdez

Por aquela altura, tinha começado a trabalhar como vendedor e ganhava à comissão. Tinha uma moto com a qual fazia os seus percursos. Um novo desafio se lhes apresentou, devia levar todos os dias os filhos porque ainda eram muito pequenos, tinham 7 e 5 anos. “Eles entravam às 8h00. Eu devia apresentar-me ao trabalho às sete, tive que desistir e sair da rua como vendedor ambulante”, explica.

Não esquece o apoio que recebeu dos seus companheiros. Em várias ocasiões fizeram rifas e polladas [1](Chicken party) para lhe arranjarem algum dinheiro, porque só o salário nunca foi suficiente.

As primeiras semanas na Fundação foram difíceis, os filhos tinham-se tornado muito antissociais e Dionisio recebia chamadas, todos os dias, dos educadores. “Um deles trepou para um dos pilares e ameaçava que se ia atirar, porque queria ser o centro da atenção. Não percebia que devia esperar pela sua vez. Para que, descesse tínhamos que achar alguma coisa de que ele gostasse”, intervém Ángel.

Mas hoje, ao fim de quatro anos, vê-os saudáveis e com bom aspecto. Sabem ler e escrever correctamente. Não se esquecem de pedir licença ao passar e, de sorrir todos os dias. O sol brilha, de novo, para eles.

Estes pequenos são muito mais maduros que o resto dos seus companheiros. Conhecem o sacrifício do pai e, sabem o muito que ele se esforçou para que eles vivessem melhor.

Quando vão para casa encarregam-se de limpar ou de preparar o jantar quando o pai chega tarde. “Eu não tenho horário, o mais velho é o meu braço direito. Se ainda não cheguei ele vai à despensa e, prepara o lanche. Mas, se chego cedo sou eu, quem lhes prepara o jantar”, acrescenta Dionisio.

O sonho

“Às vezes jogo ao bingo e, eles dizem-me: papá se ganharmos vamos juntar para comprar a nossa casa”, confessa o pai. Ter casa própria para não ter que se mudar, de tanto em tanto tempo, é o seu maior anseio, além de um trabalho com seguro de IPS, visto que, hoje, ganha somente 350.000 guaranis[2], por semana.

As pessoas que o rodeiam admiram a sua força. É um exemplo para muitos pais e mães que não cumprem com as suas obrigações. “Não há melhor experiência que ver crescer os filhos e ter, com eles, uma relação de proximidade”, conclui o papá super-herói.

Mais informação, também sobre como contribuir para a Dequeni: www.dequeni.org.py

[1] Fazem uma churrascada de frangos que acompanham com cervejas e chamam todos os vizinhos e amigos para virem comer pagando.

[2] 350.000 guaranis equivalem a 59,50 euros

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Original: espanhol. Tradução: Lena Castro Valente, Lisboa, Portugal

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